Os bichos pedem passagem

Você está indo viajar de carro ou de ônibus. De repente, olha para cima e vê uma passarela diferente. Ela tem muita vegetação e parece que não foi feita para a travessia de humanos. Quer saber? Não foi mesmo! Essas passagens foram pensadas para que a fauna de determinado local possa cruzar em segurança as estradas que cortam seu ambiente. Vamos descobrir mais sobre isso?

Foto Emanuelle Pasa

Todos nós precisamos nos movimentar todos os dias. Para ir à escola, à padaria, visitar a família, os amigos… E esse deslocamento não é algo específico dos humanos não! Outros animais também levam a vida indo e vindo. Alguns andam, saltam ou se arrastam pelo chão, enquanto outros, os chamados arborícolas, vivem praticamente no ponto mais alto da floresta e se deslocam pelas copas das árvores, seja para buscar abrigo, alimento ou companhia para namorar. Entre estes animais estão os macacos, as preguiças, os ouriços, as serpentes e as pererecas. 

Agora, vamos pensar um pouco. Nós, humanos, para organizar o nosso deslocamento, precisamos de ruas, avenidas e estradas. Só que, quando construímos essas vias para carros, ônibus e outros meios de transporte, dividimos o ambiente em pedaços. E, para conseguirmos ir de uma parte a outra, precisamos de alguns elementos de conexão, como passarelas e faixas de pedestres. Mas… e os bichos, como ficam? 

Quando estradas e avenidas cortam florestas, a fauna também fica isolada, sem ter como ir de uma parte para a outra. No caso específico dos animais arborícolas, que se deslocam de galho em galho, o que será que pode ser feito para que sigam trilhando seu caminho?

Passarela dos bichos

Engenheiros e pesquisadores resolveram se unir para enfrentar esse desafio. O propósito era criar estratégias que resultassem na travessia segura para os animais, mantendo a conexão das árvores da floresta entre os dois lados de uma estrada. Inspirados em passarelas para pedestres cruzarem grandes avenidas e rodovias, veio a ideia de construir algo similar para outros animais. 

É claro que para atrair os bichos a utilizarem suas próprias passarelas foi preciso tentar imitar o local onde vivem, como os galhos das árvores. Daí surgiram estruturas atraentes, usando diferentes materiais, como cabos de aço, corda, troncos de madeira e metais, para construir desde pequenas pontes até grandes viadutos com vegetação para os bichos se deslocarem em segurança por cima das estradas. 

Podemos chamar essas ideias de soluções baseadas na natureza, porque elas realmente tentam imitar os processos naturais e a forma como a natureza estava naquele lugar. Mas há um nome específico para essas estruturas que permitem aos animais essa travessia segura: passagens aéreas (ou superiores) de fauna – pelo fato de cruzarem por cima da estrada.

Atravesse aqui!

E será que os animais arborícolas usam mesmo essas passagens aéreas de fauna? A resposta é sim! Quer conhecer algumas? Olha só…

Ponte de corda para bugios-ruivos, no Rio Grande do Sul.
Foto Larissa Gonçalves
Cabo de aço para saguis-de-cara-branca, no Espírito Santo.
Foto Franciane Almeida
Tronco de madeira para micos-leões-pretos, em São Paulo.
Foto Francini Garcia

Mas também existem passagens de fauna para animais que não têm a habilidade de escalar e se pendurar nos galhos, como cachorros-do-mato, capivaras, antas e tatus. Nesse caso, chamamos de passagens de fauna subterrâneas (ou inferiores), porque estão localizadas embaixo da estrada.

Passagem de fauna subterrânea.
Foto Larissa Gonçalves

Para todos

Mesmo as passagens pensadas para algum animal em específico acabam possibilitando o deslocamento de outros. Portanto, não se espante se, ao observar a ponte de corda para bugios-ruivos, você vir um desfile de ouriços, gambás, preguiças, esquilos e outros macacos. Na verdade, quando presenciamos uma cena dessas, o que temos de fazer é comemorar, porque o uso dessas passagens áreas de fauna pode reduzir os efeitos que as estradas têm no deslocamento e na vida desses animais, prevenindo, por exemplo, atropelamentos.

Confira alguns dos animais que já foram fotografados utilizando passagens aéreas de fauna no Brasil.
Fotos Emanuelle Pasa (bugio-ruivo e serelepe) e Elisa Ilha (gambá-de-orelha-branca e ouriço-cacheiro).

Mas é importante que, depois de instaladas, essas passagens sejam monitoradas, para saber se os animais estão conseguindo mesmo cruzar por elas, quantos são, se estão fazendo a travessia completa e com que frequência, se a passagem está ajudando a manter o deslocamento seguro deles… Enfim, são diversos aspectos a controlar.

Com esse monitoramento, que é feito por câmeras ativadas pela presença ou pela temperatura dos animais (chamadas armadilhas fotográficas), também conseguimos identificar quais espécies não estão utilizando as passagens, e assim pensar em ajustes para melhorar essas estruturas ou bolar soluções diferentes. 

Em resumo, os cliques disparados pelas câmeras na passarela dos bichos rendem muitas informações para a sobrevivência de diversas espécies!

Bibiana Terra Dasoler
Núcleo de Ecologia de Rodovias e Ferrovias
Departamento de Ecologia
Universidade Federal do Rio Grande do Sul 

Larissa Oliveira Gonçalves
Laboratório de Evolução, Sistemática e Ecologia de Aves e Mamíferos
epartamento de Zoologia
Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Assista ao vídeo de um bugio-ruivo atravessando uma estrada por uma ponte de corda.

Matéria publicada em 28.02.2025

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