História eletrizante do Brasil

Tupã, o “pai que está no alto”, gosta de ficar sentado em um banquinho, de onde contempla o que acontece na terra. Mas, de vez em quando, também sente saudades de sua mãe, Nhandecy, e decide arrastar o banco para sentar-se de frente para ela. O barulho do móvel que se arrasta é o ruído do trovão. A luz que ilumina o céu em noites de tempestade, o brilho do tembetá (ornamento labial) de Tupã.

A beleza e o poder dos raios sempre atraíram a curiosidade das pessoas. Ao longo da história do Brasil, podemos observar que esse fenômeno foi rodeado de mitos. (foto: ELAT / INPE / Guilherme Schild)

A beleza e o poder dos raios sempre atraíram a curiosidade das pessoas. Ao longo da história do Brasil, podemos observar que esse fenômeno foi rodeado de mitos. (foto: ELAT / INPE / Guilherme Schild)

Esta é apenas uma das várias histórias indígenas que envolvem raios e tempestades. Outras lendas dizem que os trovões são, na verdade, demonstrações de que Tupã está zangado. E sabia que veio dos índios a expressão que diz que “um raio não cai duas vezes no mesmo lugar”? Eles acreditavam nesse mito, e costumavam usar pedaços de troncos de árvores queimadas por raios como amuletos de proteção.

Essas e outras curiosidades estão no livro Brasil: que raio de história, do engenheiro eletricista Osmar Pinto Jr. e da jornalista Iara Cardoso, ambos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais. Eles decidiram contar como, em diferentes épocas, os raios foram compreendidos no Brasil.

Muitos fatos importantes da nossa história, como a chegada da família real portuguesa ao Rio de Janeiro, em 1808, têm relação com as tempestades. Durante a viagem, por exemplo, a comitiva de 46 navios que traziam Dom João VI e sua corte para o Brasil passou por poucas e boas. Além dos raios assustadores, o movimento forte das águas causou enjoo e pânico nas pessoas. Um dos mais assustados era o próprio rei, que morria de medo de relâmpagos!

A família real portuguesa passou por poucas e boas em sua viagem de navio ao Brasil, no início do século 19. Durante o percurso, eles enfrentaram fortes tempestades e os navios foram atingidos por raios. (imagem: Wikimedia Commons)

A família real portuguesa passou por poucas e boas em sua viagem de navio ao Brasil, no início do século 19. Durante o percurso, eles enfrentaram fortes tempestades e os navios foram atingidos por raios. (imagem: Wikimedia Commons)

O quê? Não sabia? Pois saiba que a fama de medroso do monarca era grande. Dizem que, quando havia uma tempestade, o rei, de tanto medo, cancelava seus compromissos e ficava trancado em seus aposentos, com janelas e portas fechadas. Mesmo assim, Dom João foi um importante incentivador das ciências, inclusive do estudo de raios.

Essa área da ciência começou a se fortalecer no país em meados do século 19, no Observatório Imperial (atual Observatório Nacional). Mas só décadas mais tarde o estudo das tempestades foi reconhecido pelas pessoas como realmente importante, sobretudo porque ajudava a prevenir acidentes como naufrágios que deixavam dezenas de mortos.

De 2000 a 2014, em média, o Brasil registrou 111 mortes por ano por causa de acidentes com raios. Mas uma boa parte delas poderia ser evitada se as pessoas tivessem mais informações sobre como se proteger durante as tempestades. (foto: ELAT / INPE / Fedrizzi Junior)

De 2000 a 2014, em média, o Brasil registrou 111 mortes por ano em acidentes com raios. Mas uma boa parte delas poderia ser evitada se as pessoas tivessem mais informações sobre como se proteger durante as tempestades. (foto: ELAT / INPE / Fedrizzi Junior)

Hoje, o Brasil tem uma das melhores redes de detecção de raios do mundo, o que ajuda a entender como esse fenômeno acontece e como as ações humanas podem influenciar a ocorrência de raios nas diferentes regiões do país. Conhecer bem os raios é o primeiro passo para compreender seu poder de destruição e prevenir acidentes!

capa livro
Brasil: que raio de história

De Osmar Pinto Jr. e Iara Cardoso
Editora Oficina de Textos