Olha essa situação: você deixou cair algo muito importante no quintal dos vizinhos, num momento em que eles não estão em casa. Você estica o braço pela grade do portão, tentando alcançar o seu precioso objeto, mas se lembra de um detalhe: o cachorro bravo! Você recolhe o braço rapidamente. Afinal, se ele agarra um dedinho seu que seja, não vai brotar outro no lugar, não é mesmo?
Para alguns animais, porém, perder uma parte do corpo não é um problema. Aranhas, polvos, grilos, minhocas, lagartos e peixes são alguns dos animais capazes de praticar a autotomia, que é o comportamento de se desfazer de uma parte do corpo como estratégia de defesa.
A princípio pode parecer loucura, mas se não fosse uma estratégia eficiente não estaria presente em tantos e diferentes grupos de animais. É que, geralmente, as partes do corpo desprendidas são membros, caudas e pedaços da pele, consideradas partes não vitais. Fácil imaginar, por exemplo, que um braço ou perna não deve fazer tanta falta assim para um polvo ou uma aranha, não é mesmo? Outros animais, como lagartos, usam até estratégias adicionais na cauda, como cores chamativas e movimentos bruscos, tentando atrair o ataque dos predadores para essa parte “descartável” do corpo
Além disso, a maioria dos animais que fazem autotomia também possuem a capacidade de regenerar os membros perdidos (as cobras são uma exceção). As campeãs nesse quesito são as salamandras, que podem regenerar as patas, a cauda e até órgãos internos! Há tempos a ciência estuda esses animais tentando aplicar esse conhecimento na regeneração de órgãos e cura de lesões graves em humanos. Nesse caso, a cena imaginada no início do texto não seria tão desesperadora assim, mas ainda é preciso pesquisar muito!
Vinícius São Pedro,
Centro de Ciências da Natureza,
Universidade Federal de São Carlos
Sou biólogo e, desde pequeno, apaixonado pela natureza. Um dos meus passatempos favoritos é observar animais, plantas e paisagens naturais.
Matéria publicada em 04.12.2019