Fundo do Oceano em risco

O mar profundo tem mais importância do que podemos imaginar

Eurythene plasticus
Foto Wikipédia

O maior ambiente da Terra se chama “mar profundo”. Ele começa abaixo dos 200 metros até atingir quase 11 quilômetros de profundidade no oceano. Por mais que pareça um lugar muito distante, e por isso pouco importante para nós, habitantes da superfície, a história não é bem assim…

Já ouviu o ditado “o que os olhos não veem, o coração não sente”? Sem ter conhecimento do mar profundo, nós, da terra firme, seguimos despejando no mar todo tipo de resíduos – restos de antibióticos, munições, materiais radioativos e até as sobras da queima do carvão usado como combustível em embarcações a vapor que funcionaram ao longo de séculos! Tudo isso impactou muitas regiões do fundo
do oceano.

Outro tipo de agressão ao mar profundo vem das embarcações atuais e também do excesso de lixo produzido nos dias de hoje. Embora o descarte no oceano seja proibido desde os anos 1970, ainda são frequentes os casos de despejo ilegal, sobretudo de plásticos, que podem ir parar no mar em pequenas porções, menores do que um grão de arroz, como os microplásticos, ou impossíveis de ver a olho nu, como os nanoplásticos. Esse material leva muito tempo para ser destruído no ambiente e pode ser arrastado por centenas de quilômetros mar adentro, tão profundamente que já foram encontrados fragmentos plásticos em uma nova espécie de crustáceo (Eurythene plasticus) localizado há mais de 6 quilômetros de profundidade. Além disso, há plástico encontrado no corpo de muitos organismos, provocando diversos males à saúde deles e à nossa, uma vez que esses mesmos animais podem ser capturados na pesca e servir de alimento para os humanos.

Falando em pesca, além de organismos, como peixes e crustáceos contaminados, está diminuindo a quantidade de pescado disponível por conta da pesca em excesso ou sobrepesca. E, para explorar novos ambientes, as frotas pesqueiras, que ficavam em regiões próximas à costa, hoje buscam capturar animais em regiões cada vez mais distantes e no mar profundo, causando danos, algumas vezes, irreversíveis. Gigantescas redes de arrasto, por exemplo, engolem e estilhaçam os recifes de coral e esponjas milenares, transformando o fundo mais fundo do mar em um campo de destroços.

No Brasil, por exemplo, a maior parte do óleo e do gás são produzidos a partir de reservatórios explorados em grandes profundidades. Essa atividade causa impactos durante a extração, contaminando e agredindo o fundo do mar com as perfurações, além dos derrames acidentais de óleo.

Há também a busca por minérios raros no fundo do mar, como o cobalto. Essa atividade pode afetar a vida de pequenos organismos que vivem nessas regiões e produzir poluição sonora que pode prejudicar até a vida das baleias. A mineração também gera sedimentos que asfixiam organismos filtradores e impedem a comunicação por bioluminescência, um fenômeno comum na escuridão, que é a capacidade que alguns
organismos têm de se autoiluminar.

Assim como a Amazônia na terra firme, o mar profundo é visto por alguns como um ambiente a ser explorado pela sua abundância em recursos. Precisamos mudar essa visão com educação ambiental e respeito pela natureza ou áreas e organismos de mar profundo serão perdidos antes de serem estudados, entendidos e valorizados.


Tássia Biazon
Cátedra UNESCO para a Sustentabilidade do Oceano
Universidade de São Paulo  

Gabriel Stefanelli Silva,
Instituto Oceanográfico, Universidade de São Paulo.

Matéria publicada em 08.11.2023

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