Pré-histórico gaúcho

Os calombos nas costas do Protuberum cabralensis renderam a ele o apelido de "Bolotudo" (imagens: Marina Soares).

Há 220 milhões de anos, um grupo diferente de animais habitou a região onde atualmente fica o estado do Rio Grande do Sul e parte da Argentina. Os cinodontes eram animais terrestres bastante numerosos, que deram origem aos primeiros mamíferos. Agora, um grupo de paleontólogos gaúchos acaba de descrever uma nova espécie de cinodonte, que apresentava características muito peculiares: uma série de calombos em seu dorso – as costas! –, que provavelmente o ajudava a cavar sua toca.

O animal foi batizado de Protuberum cabralensis, mas acabou apelidado de “Bolotudo” pelos pesquisadores, por conta dos calombos – ou bolotas – que seu corpo apresenta. Os fósseis do crânio e de parte do esqueleto do animal foram encontrados entre 1977 e 1989 por um paleontólogo amador, o padre Daniel Cargnin, na cidade de Novo Cabrais, a 210 quilômetros de Porto Alegre. Mas apenas recentemente, com um estudo mais detalhado, percebeu-se que se tratava de uma nova espécie.

“Os fósseis estavam em ótimo estado de conservação, apesar dos mais de 200 milhões de anos de idade”, explica a paleontóloga Marina Soares, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, que fez parte da equipe que estudou o animal. “Eles ficaram expostos no Museu Municipal Guido Borgomanero, na cidade gaúcha de Mata, por algum tempo, mas não chegaram a ser estudados”.

De acordo com Soares, esse é o único exemplar dos cinodontes que apresenta essas protuberâncias nas costelas, que poderiam ajudar o animal a cavar sua moradia. “Podemos perceber, além dos calombos, que o animal era robusto e possuía um tórax e um crânio bem fortes”, comenta. “Essas características podem indicar que esse animal tinha hábito de escavar a terra.”

Tamanho de um labrador
A paleontóloga conta que o P. cabralensis era herbívoro e tinha menos de 1,5 metro de comprimento e altura semelhante à de um cão labrador. A parte superior do seu crânio também era mais grossa, talvez porque ele usasse a cabeça para brigar com outros da sua espécie, assim como os cabritos atuais.

O P. cabralensis, provavelmente, ainda apresentava mais semelhanças com os mamíferos modernos, como a presença de pelos no corpo. Os mamíferos que conhecemos hoje, porém, descendem de um outro grupo de cinodontes, que eram carnívoros e também habitavam a região do Rio Grande do Sul.

Para Soares, essa descoberta é importante, pois também ajuda a entender melhor como era a região naquela época. “Há 200 milhões de anos, a Terra era bem diferente, tanto com relação ao clima quanto ao ambiente”, explica. “Achados como esse nos ajudam a retratar de maneira mais fiel o cenário que tínhamos tanto anos atrás”.