O homem, o tucano e as palmeiras

A teoria da evolução, você já deve saber, explica como os seres vivos foram se modificando ao longo do tempo até atingirem as formas que têm hoje. Quase sempre, quando falamos dessas modificações, estamos pensando em um período bem longo, pelo menos alguns milhares de anos. Mas você sabia que também é possível acompanhar a evolução em menos de um século, e que o homem pode influenciar nesse processo?

Palmeira juçara

As palmeiras juçara, de onde obtemos o palmito, são típicas da Mata Atlântica e, geralmente, produzem tanto sementes grandes quanto sementes pequenas (Foto: João Medeiros / CC BY 2.0)

Um grupo de pesquisadores brasileiros acaba de mostrar como a ação do homem está interferindo (e rápido) na evolução de uma espécie de árvore: a palmeira juçara. Ao observar mais de 20 áreas de Mata Atlântica no país, os cientistas viram que, em várias delas, as palmeiras apresentavam apenas sementes pequenas, em vez de sementes grandes e pequenas, como era de se esperar.

Com a pulga atrás da orelha, os especialistas analisaram mais de nove mil sementes e avaliaram características das áreas estudadas, como qualidade do solo, cobertura vegetal e clima. Então veio a resposta: a diminuição do tamanho das sementes ocorria sempre em áreas onde as aves de grande porte, como tucanos e arapongas, tinham sido extintas pela agricultura e pelo desmatamento.

Entre aves e palmeiras

Para entender melhor o que uma coisa tem a ver com a outra, saiba que as aves frugívoras (ou seja, que comem frutos) são fundamentais para espalhar as sementes das árvores. Depois de comer, essas aves voam para outros lugares e regurgitam ou eliminam as sementes nas fezes.

Pois bem. Cada bicho come a semente que cabe no seu bico, certo? Sem aves grandes, as frutas maiores, onde estão também as maiores sementes, acabam apodrecendo no pé. Enquanto isso, os pássaros pequenos continuam espalhando as sementes menores.

Tucano

O desmatamento e outras ações humanas fizeram com que aves de grande porte, como tucanos e arapongas, desaparecessem de certas regiões de Mata Atlântica. Nos locais onde isso aconteceu, as palmeiras juçara passaram a produzir apenas sementes pequenas (Foto: Lindolfo Souto)

O resultado é que, em menos de um século, foi possível observar nessas regiões a ação da seleção natural, um princípio fundamental para a teoria da evolução que diz que, na natureza, sobrevivem os organismos mais adaptados ao habitat – no caso, as árvores com sementes menores.

Espécie fragilizada

Por enquanto, os pesquisadores não identificaram consequências graves do sumiço das grandes sementes: as palmeiras juçara continuam firmes e fortes. Porém, já se sabe que as sementes menores são mais frágeis e menos resistentes à seca, o que colocaria a palmeira em risco caso, no futuro, o clima se torne mais quente nessas áreas.

Mata Atlântica

Cientistas acreditam que outras plantas da Mata Atlântica podem estar passando por processos semelhantes. O mesmo pode ocorrer na Amazônia e em florestas tropicais na África, Ásia e Américas (Foto: Pedro Jordano)

Vamos cruzar os dedos para que isso não aconteça! A palmeira juçara serve de alimento para dezenas de espécies da Mata Atlântica e, se desaparecer, pode desequilibrar toda a cadeia alimentar do bioma. Já pensou?