O que você pensaria se descobrisse que os indígenas do povo Xavante colocam fogo todos os anos em enormes áreas de vegetação de suas terras? Ao saber disso, muita gente logo pensa que a prática pode causar danos à natureza. Mas cientistas têm mostrado que a queimada provocada pelos índios no cerrado, na região central do país, está, na verdade, ajudando a preservar a fauna e a flora.
Os índios xavantes usam o fogo há séculos para caçar – hábito conhecido como caçada de fogo. Nessas ocasiões, os jovens e os mais velhos da aldeia saem juntos para a mata e ateiam fogo na vegetação seca para espantar os animais. A caça é geralmente assada e servida em ocasiões especiais, como casamentos e rituais de passagem da adolescência para a vida adulta.
O antropólogo James R. Welch, da Fundação Oswaldo Cruz, conta que essas queimadas são planejadas pelos mais velhos de modo que o fogo não se alastre sem controle, deixando as plantas vivas a salvo. Antes de iniciar uma caçada de fogo, eles prestam muita atenção na vegetação, no vento e na época do ano.
“Os xavantes sabem exatamente o lugar certo para queimar, é impressionante como eles conseguem prever com exatidão para que lado o fogo vai e como ele se comporta”, diz.
Carlos Coimbra, também antropólogo da Fundação Oswaldo Cruz, explica que os indígenas conseguem controlar o fogo de maneira que as chamas não fiquem muito elevadas e não atinjam temperaturas muito altas, o que faz com que a vegetação sobreviva.
“O fogo dos xavantes faz uma verdadeira limpeza na vegetação”, explica. “As chamas consomem as folhas secas que vão se acumulando no solo e isso é muito importante porque essas folhas são um verdadeiro combustível que pode gerar grandes incêndios fora de controle se atingidas por fagulhas, como as provocadas pela queda de um raio.”
Além disso, a bióloga Vânio Pivello, da Universidade de São Paulo, explica que o cerrado é um ambiente muito particular, pois evoluiu com o fogo. Isso fez com que as plantas de lá precisem de fogo moderado para crescer bem. “O fogo não é só benéfico como necessário para o cerrado”, garante. “Há plantas do cerrado que precisam do fogo para florescer e dar frutos e muitos animais se alimentam dessas plantas.”
Mas não fique pensando que o fogo é bom para qualquer vegetação. Vânia explica que as queimadas precisam ser bem controladas para ter um efeito positivo e que cada bioma tem as suas necessidades – na floresta amazônica, por exemplo, o fogo é muito destrutivo.