Nesta coluna, vamos lembrar autores das mais diversas épocas e regiões, que desenvolveram ideias inspiradoras para educadores que atuam nas salas de aula do Ensino Fundamental, no Brasil de hoje.
Nesta edição vamos falar sobre Loris Malaguzzi, idealizador da abordagem Reggio Emilia, que revolucionou as práticas pedagógicas da Itália a partir dos anos 50 do século 20, no período após a 2ª Guerra Mundial.
(…)
a criança tem
cem línguas
cem mãos
cem pensamentos
cem maneiras de pensar
brincar e conversar
cem, sempre cem
maneiras de ouvir
surpreender amar
cem alegrias
cantar e entender
cem mundos
descobrir
cem mundos
inventar
cem mundos
sonhar.
a criança tem
cem línguas
(…) escola e cultura
separam sua cabeça de seu corpo.
Dizem a ela:
pensar sem as mãos
fazer sem cabeça
ouvir e não falar
entender sem alegria
(…) Dizem a ela:
que joga e trabalha
realidade e fantasia
ciência e imaginação
o céu e a terra
razão e sonho
são coisas
que não estão juntas.
Em suma, dizem a ela
que a centena não está lá.
A criança diz:
Em vez disso, a centena está lá.
(trechos do poema de Loris Malaguzzi)
Loris Malaguzzi nasceu em Correggio, em 23 de fevereiro de 1920, cresceu em Reggio Emilia, onde formou-se em Pedagogia em 1946. Durante a guerra, lecionou em escolas primárias e secundárias em Reggio Emilia e em algumas cidades da região. Começou a escrever como jornalista no final da década de 1930, interessou-se por teatro, cinema, arte, esporte, política, educação e participou ativamente na nova vida cultural de Reggio Emilia.
A partir do final de 1946 foi professor e depois Diretor do Convitto Scuola della Rinascita em Rivaltella (Reggio Emilia). Ali, começou a tecer suas primeiras relações com a pedagogia internacional e participou dos primeiros encontros pedagógicos europeus do pós-guerra como membro da Fédération Internationale des Communautés d’Enfants.
Seguiu em Roma, no Instituto Nacional de Psicologia do National Research Council – um dos primeiros cursos de Psicologia Clínica, disciplina proibida durante o fascismo. Em 1951, como psicólogo, foi um dos fundadores do Centro Médico Psicopedagógico Municipal de Reggio Emilia, onde trabalhou por quase 20 anos. Dentro do Centro, originalmente dirigido a crianças e jovens” com deficiência e problemas escolares”, foi inaugurada uma pequena escola com o nome de Giuseppe Lombardo Radice, que se tornou uma espécie de laboratório experimental, com especial atenção para as habilidades motoras e as linguagens expressivas.
Toda criança é um sujeito e tem direitos. Cada criança, individualmente e na relação com o grupo, é construtora de experiências às quais é capaz de atribuir sentido e significado.
A criança tem cem formas de pensar, de se expressar, de compreender, de ir ao encontro do outro através de um pensamento que não separa as dimensões da experiência. As cem línguas são uma metáfora para o extraordinário potencial de aprendizagem das crianças, para os processos cognitivos e criativos, para as múltiplas formas com que o conhecimento é construído. Nas escolas, nossa tarefa é valorizar todas as linguagens verbais e não verbais com igual dignidade.
A pesquisa entre adultos e crianças é uma atitude necessária para interpretar a complexidade do mundo, e é uma poderosa ferramenta de renovação na educação. A pesquisa, visibilizada pela documentação, constrói aprendizados, reformula conhecimentos.
A documentação é parte estrutural das teorias e didáticas educacionais. Torna visível e mensurável a natureza dos processos subjetivos e grupais de aprendizagem de crianças e adultos, tornando-os um patrimônio comum.
A ação educativa concretiza-se através do planejamento das unidades de ensino, dos ambientes, da participação, da formação do pessoal, e não da aplicação de programas pré-definidos. Nossos objetivos são alcançados através da articulação entre a organização do trabalho e a pesquisa educacional.
Os espaços internos e externos da escola são pensados e organizados de forma interligada e se oferecem como locais de convivência e pesquisa para crianças e adultos. O ambiente interage, muda e ganha forma em relação aos projetos e experiências de aprendizagem, num diálogo constante entre arquitetura e pedagogia. Cuidar de móveis, objetos, locais de atividade é um ato educativo que gera bem-estar psicológico, sensação de familiaridade e pertencimento, senso estético e prazer de viver.
A avaliação é um processo estruturante da experiência educacional e gerencial, que pertence a todos os aspectos da vida escolar e se configura como uma ação pública de diálogo e interpretação. Com esse objetivo, as escolas de Reggio Emilia utilizam ferramentas e práticas como documentação, participação das famílias e realidades territoriais, participação no sistema público integrado.
A história das escolas municipais de Reggio Emilia está profundamente ligada à vida e ao pensamento de Loris Malaguzzi.
Explore o site para saber mais sobre essa proposta educacional única!
Marcia Stein
Jornalista, educadora e integrante do conselho editorial da CHC