Maria da Conceição de Moraes Coutinho Beltrão nasceu em 1934, na cidade de Macaé, Rio de Janeiro. Imagine que, desde criança, ela já tinha idéia do que gostaria de fazer quando crescesse: se tornar uma investigadora do passado! Não é à toa, portanto, que os desenhos das preguiças gigantes, animais extintos há milhares de anos, eram os que mais lhe chamavam a atenção nos livros que lia na infância. A menina cresceu mantendo o interesse pelo antigo: tornou-se arqueóloga, uma cientista que estuda a cultura e os costumes de povos que viveram na Terra há milhares de anos. Seu trabalho consiste em encontrar e analisar ossos, objetos, pinturas, enfim, qualquer prova da existência desses povos do passado, que tenha sido preservada pela natureza.
Para saber mais sobre essa profissão, acompanhe a conversa que a CHC teve com Maria Beltrão. Além de cientista, ela também é escritora e nos contou como nasceu o seu livro de arqueologia para crianças: O homem pré-histórico e o céu .
Quando e por que a senhora decidiu ser arqueóloga?
Eu tinha nove anos e gostava muito de ler. Com a autorização do meu pai, fui lendo vários livros de sua biblioteca. Mas, certo dia, ele me viu lendo um livro bastante adiantado para a minha idade. Delicadamente, disse-me que o livro não era apropriado e me indicou um outro de ciências naturais e acrescentou: “Maria, você gosta muito da natureza, vive observando tudo e cavucando a terra. Tenho certeza que você vai gostar de ciências”. E ele tinha razão.
O que faz um arqueólogo?
Sempre fui muito curiosa e, desde pequena, queria saber como eram as coisas e as pessoas que viveram neste mundo antes de nós. Por isso, resolvi estudar arqueologia. Os arqueólogos participam de escavações, analisam objetos e pinturas antigas, procurando pistas sobre o que aconteceu por aqui no passado. Já descobri muita coisa legal! A maioria dos objetos que encontro vai para os museus. Outros são mais divertidos de ver lá mesmo nos locais onde ficaram durante todo esse tempo. Às vezes, parece que estou brincando de detetive. A cada momento aparece um sinal diferente e a nossa investigação fica mais emocionante.
Seu trabalho envolve trocas de conhecimentos com outras áreas? Por quê?
Sim. O arqueólogo trabalha escavando as várias camadas da terra, por isso, precisa ter conhecimentos de geologia, que estuda a Terra e suas transformações. Às vezes, ao escavar um terreno, encontro animais que se extinguiram há milhares de anos. Nestes casos, preciso ter conhecimentos de paleontologia – que estuda animais e fósseis extintos. Quando encontro esqueletos recentes, preciso ter conhecimentos sobre a antropologia biológica – ciência que analisa o homem de hoje. Se os esqueletos são muito antigos, vou precisar dos conhecimentos da paleontologia humana – que estuda a evolução do homem primitivo. Por isso, é muito importante fazer um trabalho interdisciplinar, com equipes de diversas áreas, para dar conta do trabalho.
Quando criança, a senhora pensou em ter outra profissão?
Nunca pensei. Desde que vi no livro do meu pai uma preguiça gigante, nunca mais deixei de me interessar pelo assunto. Curioso é que, nas minhas escavações pela Bahia, encontrei vários ossos de preguiça gigante. Se fosse escolher hoje uma nova profissão, eu escolheria a astronomia. Como as estrelas são muito antigas, eu poderia também vasculhar o passado e fazer descobertas. A astronomia tem uma maneira bonita de olhar para o passado: observando as estrelas.
A senhora também é escritora. Quantos livros já escreveu? Todos centrados na arqueologia?
Já escrevi nove livros sobre arqueologia e tenho dois livros infantis em preparação. Já publiquei também algumas poesias.
O homem pré-histórico e o céu é o seu primeiro livro para crianças? Como nasceu a idéia de escrever um livro de pano para esse público?
Sim. Eu quis fazer um livro que tivesse características antigas, por isso, escolhi o livro de pano. Os livros de pano e as colchas de retalhos são tradições passadas de mãe para filhos e combinam muito com a proposta arqueológica. É também um material que resiste mais ao tempo, além disso, ele pode ser lavado e compartilhado com a família e os amigos. Mas, infelizmente, a edição é muito cara. Acabei fazendo uma edição pequena (500 exemplares) e artesanal para ser distribuída. Tenho um projeto de republicá-lo em parceria com uma instituição ligada à astronomia.
A senhora pensa em escrever outros livros para crianças?
Sim, já tenho dois em andamento. Quero levar o conhecimento científico para as crianças, pois são elas que podem modificar o mundo. Elas serão os nossos cientistas no futuro.
O que a senhora diria para as crianças que pensam ser um dia arqueólogos?
O arqueólogo é um cientista e deve ser contestador por natureza. Portanto, não deve aceitar apenas as idéias dos outros. Ao contrário, o cientista deve procurar outros caminhos, ir adiante e além. Eu sempre procurei também desenvolver trabalhos que ultrapassassem os limites da universidade. É preciso popularizar a informação e aproximar o homem comum do conhecimento.