A arte fantástica do surrealismo

Triiiim, triiiim, triiiim. Toca o telefone e Madame Pontual corre para atendê-lo. No lugar do gancho, uma lagosta. A senhora não fica contente com a notícia que recebe e seus ponteiros começam a rodar rápido. Ponteiros? Sim! O rosto de Madame Pontual é um belo relógio! Ela precisa correr porque os fósforos de sua filha estão em chamas, e, por isso, aproveita para pegar carona em uma árvore-pássaro que vai passando…

O surrealismo é caracterizado por imagens absurdas - como os tigres saídos da boca de um peixe, pintados pelo espanhol Salvador Dali

Surreal essa história, não é mesmo? Mas você saberia dizer porque o termo surreal é usado para designar coisas malucas e absurdas? Quem pensou em Surrealismo acertou! Esse movimento artístico surgiu na França, no início da década de 1920. As telas produzidas pelos pintores surrealistas parecem sonhos fotografados. Mas por que pintar coisas sem sentido? De onde veio a idéia de começar um movimento assim? Qual era o objetivo desses artistas?

Para compreendermos o Surrealismo é preciso entender a vida na Europa após 1918, quando acabou a Primeira Guerra Mundial. Esse conflito resultou em um grande número de mortos, não só de combatentes, como de cidadãos comuns. Cidades inteiras foram destruídas e a Europa acabou perdendo o domínio econômico sobre os demais países do mundo. Os Estados Unidos, que só haviam aderido à guerra em abril de 1917, se tornaram então a grande potência mundial.

Primeira Guerra Mundial
A rivalidade entre França e Alemanha por disputas territoriais; a insatisfação da Alemanha com a Inglaterra e França com a partilha do mundo colonial; a necessidade que a Rússia tinha de uma saída para o Mar Mediterrâneo; a escalada do nacionalismo nesses países e a corrida armamentista. Esses foram os principais motivos do início da Primeira Guerra Mundial, em 1914. Diante da impossibilidade de resolverem essas questões pacificamente, as nações formaram alianças e partiram para a guerra. A Tríplice Entente, era composta inicialmente por Inglaterra, Rússia e França. Sua oponente, a Tríplice Aliança, tinha como membros Áustria, Hungria, Alemanha e Itália. Mais tarde, países como Japão, Brasil, Romênia e Estados Unidos aderiram à guerra. Aos poucos, a guerra européia se tornou mundial.

Com essa triste situação, surgiu um movimento artístico chamado Dadaísmo. Os dadaístas contestavam, ironizavam e desmistificavam os valores da sociedade européia, a começar pela própria arte. Esse movimento serviu de inspiração ao Surrealismo. Porém, os surrealistas propunham uma ação coletiva para tornar o ser humano mais livre e criativo. Eles tentavam compreender o mundo com outro sentido, buscando tornar real o que antes era apresentado como irreal.

Dadaísmo
A contestação da arte, ilustrada na imagem abaixo — uma -brincadeira -com a famosa Mona Lisa, que aqui aparece de bigodes na pintura do francês Marcel Duchamp — foi uma característica marcante do dadaísmo.

Para os dadaístas, a guerra era uma conseqüência do progresso industrial; era preciso, portanto, negar toda história passada e qualquer projeto de uma história futura e voltar ao ponto zero. O mundo deveria ser lógico mas era insensato. A mesma tecnologia que permitia a construção de carros, construía armas de guerra. Eles eram negativistas porque não apresentavam nenhuma proposta alternativa ao mundo que eles não queriam que existisse mais.

Em 1924, foi publicado o Primeiro Manifesto do Surrealismo — manifesto nada mais é do que um texto que explica os propósitos de uma ação –, escrito pelo poeta francês André Breton, mentor do movimento. Até então, só havia escritores no grupo. Mais tarde, após a publicação do ensaio “O surrealismo na pintura”, pintores aderiram ao movimento. O surrealismo também abrangeu o cinema, a fotografia e as artes plásticas.

O surrealismo chegou também ao cinema: acima, cena do filme A idade de ouro , dos espanhóis Salvador Dalí e Luís Buñuel

Mas o grupo surrealista rapidamente se rompeu. Em 1929, Breton publicou o “Segundo Manifesto do Surrealismo” e aqueles artistas que não agiam nem compartilhavam com as idéias do poeta foram expulsos do movimento. Breton achava que o artista não poderia deixar de ser racional apenas em sua arte, mas deveria agir assim em todas as circunstâncias.

Até o fim da Segunda Guerra Mundial, o surrealismo foi considerado pela opinião pública um “acidente” sem importância. Mas, por volta de 1950, constatou-se que o movimento marcou profundamente, não só a poesia, mas o romance, o teatro, as artes plásticas e o cinema. Os maiores expoentes do movimento foram Salvador Dalí, Max Ernst e René Magritte na pintura, Man Ray na fotografia e Luís Buñuel no cinema.