Reconstruindo a pré-história

Quando os cientistas encontram um crânio, uma mandíbula ou um pedaço de osso de algum animal pré-histórico, pode apostar: vem novidade por aí.

Afinal, um simples dente, por exemplo, pode ser a chave para um mundo completamente diferente do que vivemos hoje. A partir desse achado, o cientista inicia estudos e, com sorte, chega à conclusão de que encontrou restos de um animal que nenhum outro pesquisador sabia que existia.

Para mostrar como era esse bicho quando vivo ou mesmo como era o seu esqueleto, o profissional precisa, muitas vezes, suar a camisa e contar com o auxílio de um artista especial, que se dedica a construir modelos de espécies antigas, como os dinossauros, ou retratá-los no papel em desenhos realistas.

O paleoartista Deverson da Silva (Pepi) finaliza a escultura de um animal parecido com os crocodilos atuais no Museu de Paleontologia de Monte Alto (SP).

Chamados de paleoartistas ( paleo = antigo), esses profissionais reproduzem as descobertas feitas durante escavações conduzidas pelos pesquisadores. Lançando mão de formas de arte tão diferentes quanto escultura ou ilustração, eles revelam como eram as espécies fisicamente e, com isso, o ambiente em que elas viviam – se era árido, úmido etc – e, assim, revelar um pouco da história de um período passado.

A seu lado, durante todo o trabalho, o artista tem a companhia do pesquisador. Afinal, é preciso entender bem do assunto para tentar reproduzir bichos que existiram há milhões de anos, não é?

Em geral, os locais de trabalho de profissionais tão especiais quanto os paleoartistas são universidades, museus ou institutos de pesquisa. O escultor Cláudio Ney, por exemplo, trabalha no Instituto de Geociências da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e no Museu Nacional, nessa mesma cidade.

Pepi é um paleoartista polivalente: além de esculturas, ele trabalha também com a técnica de desenho.

Partes de animais como garras e crânio, além de bichos completos como mastodontes, tigres-dentes-de-sabre e os que lembram os crocodilos atuais, já ganharam forma graças a ele. Para suas esculturas, Cláudio usa isopor, madeira, durepox, fibra de vidro, massa de modelar industrial, além de um material chamado espuma de poliuretano, que tem a textura de esponja, mas, depois de seco, pode ser esculpido e fica parecido com osso.

O paleoartista Claudio Ney Salema dá os retoques finais na escultura de um mastodonte.

“O mais interessante no meu trabalho é que um monte de ossos, fósseis de animais extintos, pode servir de base para construir um animal completo”, explica ele.

Para fazer uma escultura, o artista usa os fósseis apenas como uma espécie de fôrma, um molde para construir a réplica. Depois, eles são guardados nas instituições de pesquisa, para que continuem preservados. “Às vezes, algum osso que formava o esqueleto da espécie não é encontrado nas expedições científicas. Nesse caso, faço a reprodução com base em outras partes do animal e com as informações do pesquisador”, conta Cláudio, que também usa a informática em seu trabalho.

A escultura do mastodonte enfim pronta para ser exibida.

O artista que dá forma a animais pré-históricos usa a tecnologia para fazer um outro tipo de escultura: a digital.

Com um programa de computador, Cláudio é capaz de recriar, na tela do micro, o bicho que viveu há milhões de anos e, o que é melhor, dar a ele movimento. Assim, o escultor cria desenhos animados de bichos pré-históricos, como o que você pode ver se clicar aqui (essa animação reconstituiu o movimento do dinossauro Compsognathus – formato avi, 4,9 MB).

Do fóssil até a reconstituição final, várias etapas são necessárias para esculpir o tigre-dentes-de sabre, animal extinto há milhões de anos.

Se você ficou fascinado com esse trabalho, saiba que ver a reação das pessoas diante das suas obras é o que o paleoartista Deverson da Silva, o Pepi, mais gosta.

“Algumas crianças ficam com medo dos animais e passam longe da figura”, conta ele, que trabalha no Museu de Paleontologia de Monte Alto, em São Paulo, onde esculpe e desenha dinossauros, além de outros animais pré-históricas.

A escultura do tigre-dentes-de-sabre ganha os retoques do paleoartista Claudio Ney Salema.

Para ele, o trabalho do paleoartista é importante porque o pesquisador pode usar a obra nos momentos em que precisa de uma cópia fiel do animal para estudo ou mesmo porque o desenho pode auxiliá-lo a definir se está diante de uma nova espécie ou não. “Com as esculturas e pinturas, alguns detalhes podem ser destacados, o que ajuda o cientista no trabalho de identificação do animal”, explica.

A pintura a óleo é uma das técnicas usadas na paleoarte. Esta foi feita por Deverson da Silva.

Por essas e outras, o trabalho do paleoartista é considerado fundamental, principalmente na hora de divulgar as descobertas feitas pela ciência. Como explica a professora Lílian Paglanelli Bergquist, do Departamento de Geologia da UFRJ, “esses artistas são o elo entre o público e o cientista, graças aos desenhos ou esculturas que fazem.”

Matéria publicada em 16.02.2006

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Cathia Abreu

Adoro aprender coisas novas. Tenho a sorte de trabalhar me divertindo e fazendo descobertas todos os dias.

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