Imagine um objeto que você use no dia-a-dia, tão comum que você nem preste mais atenção. Um pente, por exemplo. Aposto como você nem liga para seu pente; é só mais um objeto qualquer, que a gente compra na loja e pode sempre trocar depois que estragar. É assim com quase tudo que usamos no cotidiano.
“Mas o que isso tem a ver com os índios do título?”, você vai perguntar. É que, na cultura indígena, todos os objetos, por mais corriqueiros que sejam, são considerados sagrados. Os índios acreditam que não são eles que produzem esses utensílios, mas uma força superior, que “pilotaria” as mãos deles durante a fabricação. Por isso, tudo que fabricam ganha muita importância, principalmente o que é usado nos rituais. Essa é, para eles, a idéia de “arte”. Assim, várias peças estão sendo exibidas em um museu como parte da Mostra do Redescobrimento.
Lá estão diversos utensílios que os índios empregam em seu cotidiano, como flechas, peneiras e remos, e objetos usados em suas cerimônias – sem dúvida, os mais bonitos e curiosos. Há, por exemplo, uma flauta-máscara e um colar-apito. Mas esses objetos não podem ser usados por qualquer um que queira. Cada um deles tem um significado, e é a tradição que determina o responsável por eles. Além destes, há também uma trombeta do povo Juruna, do Mato Grosso, que termina numa caveira humana.
A arte indígena é tão diferente da nossa que há objetos que não podem nem ser observados. Uma máscara do povo Tariano, do Amazonas, fica num cubículo escuro que só pode ser olhado por uma fina fresta. Segundo os índios, ela representa a entidade Jurupari, que, na crença deles, seria equivalente ao nosso Diabo. Para você ter uma idéia do quanto os tarianos temem essa máscara, preste atenção nesta história: um padre italiano, na tentativa de converter essa tribo à fé católica, reuniu-os todos e começou um longo sermão. Depois de falar muito tempo, levantou a máscara bem alto e mostrou-a a todos, tentando convencê-los que era um objeto como outro qualquer. Imediatamente, todos ficaram assustados. As crianças choravam, as mulheres fugiram e os guerreiros partiram na direção do padre para arrancar a máscara de suas mãos! Apavorado, ele saiu correndo na mesma hora!
Só que, hoje em dia, não é apenas por meio dos objetos relacionados à sua cultura que os índios expressam sua arte. No fim da exposição, há pinturas em papel feitas por artistas indígenas, representando cenas de seus costumes ou imagens de suas lendas. Elas são expostas e vendidas a qualquer pessoa que queira ter um pouco de vida indígena na parede de sua sala, exatamente como fazem os artistas da cidade. Será que, no fim, a arte dos índios vai acabar se tornando igual à nossa?