Dias quentes sempre me lembram certo episódio da infância. Por pelo menos quarenta dias, o Sol insistia em surgir às cinco da manhã e continuava radiante até o início da noite. No céu, nenhuma nuvem ou qualquer sinal de que choveria. Então, naquela segunda-feira calorenta, os problemas começaram.
O percurso até a escola, através de ruas poeirentas, era um suplício. As árvores, com suas folhas murchas, pouco ajudavam a sombrear o caminho. Um pó vermelho recobria telhados, muros e os pobres cachorros que se aventuravam pelas ruas.
Após a primeira hora de aula, o calor aumentava. Nenhuma brisa ou ventinho pela janela. As salas – sem ventilador ou qualquer tipo de refrigeração – pareciam estufas. Mais uma hora e todos estávamos molhados de suor. Ao se aproximar o recreio veio a notícia: “Acabou a água! Todos para casa!!!”
No início ficamos contentes, mas logo descobrimos que aquela não seria uma tarde divertida. Todo o abastecimento de água havia sido cortado por causa da falta de chuvas. E assim continuamos por mais uma semana. Antes, apenas os cachorros estavam recobertos de pó vermelho, mas agora eram todos os meninos, cujo banho restringia-se a algumas poucas canecas d’água. Foi horrível!
Imagine agora um mundo em que, por vezes, não chovia durante anos. Lagos e rios secavam e a terra, cada vez mais árida, impedia o desenvolvimento das plantas e levava os animais a uma procura desesperada por água. Parece desolador? Pois saiba que nada disso é ficção.
A Terra já foi assim, há 251 milhões de anos, quando todas as massas continentais se reuniram em um supercontinente chamado Pangeia. Sua extensão era tão grande que o ar úmido vindo dos oceanos não conseguia chegar em seu interior, onde dominavam ambientes áridos, e até mesmo desertos. As grandes florestas que dominavam os ambientes continentais desapareceram, dando lugar a plantas mais resistentes, como as cicas – que, aliás, existem até hoje.
Naquelas condições de clima quente e seco, surgiram novos grupos de répteis, como os cotilossauros, proganossauros e pelicossauros, que se diversificaram e adquiriram as mais diferentes formas e tamanhos, tudo para se adaptarem a um clima inóspito e extremo. Ao final do período Permiano, há 251 milhões de anos, uma avassaladora extinção levou ao desaparecimento de aproximadamente 95% de todas as espécies marinhas e de 70% das espécies que viviam sobre os continentes.
Este grande evento, que quase dizimou a vida em nosso planeta, abriu novas possibilidades para as espécies que sobreviveram – como o grupo dos lepidossauros e arcossauros –, transformando então, mais uma vez, as paisagens do mundo.
Naquele verão da minha infância, não de milhões, mas de muitos e muitos anos atrás, não nos extinguimos. Finalmente veio a chuva e, com ela, o cheiro do mato molhado, os barquinhos de papel nas águas que escoavam pelas ruas e um arco-íris no céu, a nos lembrar que, sem os ciclos da natureza, não teríamos as cores da vida.