Um mundo sem florestas

Parecia simples. Para chegarmos mais rápido até o sítio de nosso vizinho, bastava atravessarmos uma pequena mata seguindo uma trilha bem marcada e na qual não havia desvios. Na primeira entrada ao longo da estrada principal, em que se avistava apenas algumas árvores ao fundo, iniciamos a jornada.

Eu e meus amigos só nos demos conta de que caminhávamos há muito tempo quando Miguel perguntou: “Mas afinal, onde é que estamos?” Olhamos ao redor, cada um mais perplexo que o outro. Só Neném tinha uma resposta pronta: “Estamos aqui, ora. E vamos para ali…”

Entre o aqui e o ali, foram morros, riachos e muitas, muitas árvores. A paisagem, de uma pequena mata, transformou-se numa gigantesca floresta. Demoramos a descobrir que estávamos perdidos e, quanto mais caminhávamos, mais desorientados ficávamos. Naquele momento, pensei como seria bom se não existissem árvores, capim, grama e nenhum outro tipo de vegetação que nos impedisse de observar o que existia adiante. Nenhuma árvore, nenhuma planta, apenas o contorno dos morros e das curvas dos rios.

Deserto de Negev, em Israel

Como seria tedioso para nós se não existissem o cheiro, as cores e os sons das florestas! Uma pequena amostra disso é o deserto de Negev, em Israel (Foto: Wikimedia Commons)

Pode parecer estranho, mas nosso planeta já foi assim.

Nos momentos iniciais de formação da Terra, não existiam as plantas como as conhecemos hoje. A superfície terrestre era árida, coberta de rochas, sem rios permanentes e com uma umidade bastante baixa. Uma paisagem desoladora, onde nenhum animal se aventurava a viver. A incidência dos raios solares provocava temperaturas elevadíssimas e os solos eram limitados a amontoados de pequenos fragmentos de rochas.

'Rhynia gwynne-vaughanii'

Assim os pesquisadores imaginam a 'Rhynia gwynne-vaughanii', planta terrestre mais antiga de que se tem notícia (Imagem: Wikimedia Commons)

Os primeiros vegetais a existirem nos ambientes terrestres, há pelo menos 420 milhões de anos, eram pequenas plantas de parentesco longínquo com as espécies conhecidas como Psilotum, atualmente encontradas em charcos e áreas com muita umidade.

Eles surgiram a partir de plantas aquáticas, semelhantes a algas, que começaram a ter seus caules divididos e parcialmente enterrados, dando origem às raízes. Algumas porções de seu corpo conseguiam se expor ao ar, mas não possuíam folhas, flores ou frutos – eram apenas pequeninos troncos verdes ramificados, às vezes do tamanho de uma das nossas unhas!

'Psilotum'

A planta 'Psilotum' é um fóssil vivo, ou seja, pertence ao mesmo grupo a que pertenciam espécies extintas muito semelhantes. Ela é encontrada em regiões alagadas (Foto: dracophyllum / Flickr)

De lá pra cá, a variedade de plantas terrestres foi aumentando até chegar à imensa diversidade que vemos por aí: matas, campos, florestas. Pensando bem… Como seria horrível viver num mundo em que não existissem plantas! As cores das folhas, o cheiro das flores, o sabor dos frutos. Não, não seria possível suportar.

E aquele passeio de férias, como terminou? Estranhamente, não terminou. Voltamos, sabe-se lá como, ao início da trilha, sem jamais termos chegado ao sítio do vizinho. Um caminho misterioso como o das plantas, que, ao longo dos milhões de anos em que existem, se transformaram e ocuparam toda a superfície da Terra.