A aposta estava feita. Quem chegasse primeiro nas margens do rio teria o direito de comer três pães com mortadela. E assim foi feito: “Um, dois, três e… Três e meio… E jáááááááááá”, gritou Maneco.
Pedalei muito, mas muito mesmo. Porém, com minha bicicleta de roda pequena, mixuruca e meio enferrujada, não tive a menor chance. Cheguei por último, e Maneco já tinha até comido todos os pães.
Perdi a aposta, mas não a possibilidade de me esbaldar nas águas frias, transparentes e cheias de pedras arredondadas que atapetavam o fundo do canal do rio. Em suas margens, a areia fina e branca formava um remanso, onde o descanso era garantido.
Porém, nas épocas de chuva, jamais nos aproximávamos sequer de sua beirada. Violento, com as enxurradas transformava-se em um devorador de tudo o que existisse em seu caminho. Pedras, árvores, animais e até mesmo casas eram destruídas e transportadas com grande facilidade. Depois, o rio novamente se acalmava, e os detritos arrastados se acumulavam em seu leito, testemunhando seus momentos de ira.
Essa situação lembra a forma como são encontrados alguns tipos de fósseis, em especial os de grandes vertebrados, como os dinossauros, que quase sempre descobrimos desarticulados e fragmentados. Um osso aqui, outro ali, e somente os capazes de resistir ao transporte realizado por rios caudalosos e violentos conseguem se preservar por milhões e milhões de anos. Terminam, então, soterrados pelos detritos carregados pelos rios.
Na busca de fósseis, os paleontólogos consideram sempre que o presente é a chave para o passado. Se, no tempo atual, os canais dos rios transportam e acumulam muitos detritos, devemos procurar pelos fósseis em rochas que tenham sido originadas em um antigo canal fluvial. É lá que haverá mais chances de encontramos algum registro do passado da vida.
Os fósseis sempre têm uma relação com o tipo de rocha na qual são encontrados. Quando entendemos o que as rochas têm para nos dizer, aumentam as chances de descobrir algo novo. O único problema é quando não as entendemos. Aí não tem jeito – certamente não seremos bem-sucedidos em nossas descobertas.
Achar um fóssil é descobrir um tesouro, como os escondidos na água daquele rio onde eu e Maneco brincávamos e comíamos pão com mortadela. Tesouros que se foram, mas que me deixaram uma vida de felicidades.