– Enquanto esperamos o resultado de nosso experimento do “efeito Mpemba”, deixa eu te contar sobre Roger Bacon, um monge franciscano inglês que viveu no século 13.
– Nossa, agora pulamos da Tanzânia para a Inglaterra medieval…
– É, mas os dois assuntos estão relacionados. Bacon dizia que havia três maneiras de adquirir conhecimento. A primeira seria por meio de uma autoridade: quando perguntamos a um especialista o que fazer – por exemplo, quando vamos ao médico ou quando o papai leva o carro para o mecânico. Quando consultamos um dicionário ou uma enciclopédia, também estamos nos baseando no conhecimento que acreditamos que alguém que estudou e pensou bastante naquele assunto tem.
– O professor na escola também é uma autoridade?
– Sim, claro. Certamente você aprende muito, isto é, adquire conhecimento prestando atenção nas aulas dos seus professores. Eles estudaram e se prepararam para ensinar. Mas é preciso tomar cuidado com os argumentos de autoridade. Às vezes, é difícil descobrir se a pessoa que estamos considerando uma autoridade realmente sabe do que está falando.
– Quando, por exemplo?
– Quando lemos alguma coisa em um site qualquer na internet, ou mesmo em um livro, ou quando vemos um programa de TV, ou quando um suposto “entendido” vem com uma informação que ele “tem certeza” de que é verdade. O tempo todo somos bombardeados por pessoas que tentam nos convencer de que alguma coisa é verdade, mas nem sempre temos boas razões para acreditar que quem está falando é uma autoridade no assunto. Então, precisamos sempre manter as orelhas em pé e ficar atentos para não sermos enganados por argumentos de autoridade.
– Entendi. Mas você disse que eram três maneiras de adquirir conhecimento…
– Ah, sim. A segunda maneira de adquirir conhecimento, para Bacon, era o uso da razão, e esta maneira era superior à primeira. Ainda que uma autoridade diga que algo é verdade, se você raciocinar e usar a lógica e chegar a outra conclusão, esta outra conclusão deve ser mais verdadeira.
– Faz sentido. Quando conversamos sobre o “efeito Mpemba”, você disse que a água mais quente iria congelar mais rápido do que a água à temperatura ambiente. Por mais que eu quisesse acreditar em você, pai, foi só raciocinar um pouquinho que eu concluí que isso não podia ser verdade.
– Isso! Você usou sua razão para suplantar um argumento de autoridade. Mas existe ainda a terceira maneira de adquirir conhecimento, e é aqui que o pensamento de Bacon é bem moderninho. Ele diz que também é possível realizar experimentos, e que esta maneira é superior tanto à autoridade quanto ao uso da razão. A natureza é a juíza última da verdade! Ainda que a sua razão tente convencê-lo de que alguma coisa é verdade, se os experimentos mostrarem que as coisas acontecem de outra forma, você preferirá acreditar no que dizem os experimentos, não é?
– Acho que sim, mas vou ficar encucado.
– Sim, você vai ter que repensar a sua maneira de entender como as coisas funcionam, mas isso é bom. É justamente assim que a ciência – e, a propósito, a gente também–, avança o conhecimento que a gente tem do mundo.
– Saquei, pai. Muito legal esse Bacon. Vou até experimentar quando você fizer ovos com bacon no café da manhã… [risos]
– Muito bem, filho [rindo também]. Bacon ficaria orgulhoso de você. Está pronto para abrir o congelador e ver que água congelou primeiro?
(Continua…)