Que bicho esquisito! Tem o corpo alongado, como uma cobra. Mas… espere! Lembra algumas espécies de salamandra – deve ser anfíbio! Não, não, não! Tem escamas e quatro nadadeiras – ué, então é peixe! Logo que foi descoberta, no século 19, a piramboia deu um nó na cabeça dos cientistas. Quer saber como eles resolveram o enigma? Vamos viajar no tempo para descobrir!
Nossa história começa em 1817, quando a arquiduquesa da Áustria, Maria Leopoldina, mudou-se para o Brasil para viver com seu marido Dom Pedro. Junto com ela, vieram vários pesquisadores do Museu de Viena para coletar informações sobre a biodiversidade brasileira. Entre eles estava Johann Natterer.
Durante 18 anos de expedição pelo Brasil, Natterer coletou um vasto material, incluindo minerais, sementes, armas indígenas e animais – especialmente aves – que foram enviados para o Museu de Viena, onde serviram de fonte de estudo para muitos pesquisadores. Dentre os animais encontrados por ele, um dos mais curiosos foi descoberto na Amazônia.
Segundo Natterer, tratava-se de um bicho raro, pouco conhecido até mesmo pelo povo da região naquela época. O corpo alongado, com quatro nadadeiras longas e finas, dá a esse animal uma aparência estranha, que levou os indígenas a lhe chamarem de piramboia, nome que quer dizer “peixe-cobra”.
Quando os dois exemplares de piramboia capturados por Natterer chegaram à Áustria, foram examinados pelo naturalista Leopold Fitzinger. Natterer acreditava que a piramboia fosse um peixe, mas Fitzinger discordou e convenceu o colega, dizendo que se tratava de um anfíbio, parecido com algumas salamandras aquáticas que possuem o corpo alongado com braços e pernas muito pequenos – ou até ausentes.
Então, em 1837, Fitzinger deu à piramboia o nome científico Lepidosiren paradoxa, que, em uma mistura de grego e latim, poderia ser traduzido como “sereia escamada paradoxal”. Siren (“sereia” em latim) é o nome do gênero de algumas das salamandras que se parecem com a piramboia. Essas salamandras não possuem escamas (lepidos na língua grega), mas a piramboia, sim. Por isso, ela seria uma “sereia escamada”. Por fim, a dúvida sobre se Lepidosiren seria um peixe ou um anfíbio foi o motivo para o nome paradoxa, que significa “paradoxal” (contraditório) em latim.
Ao dissecar as piramboias no laboratório, Fitzinger, Natterer e outro pesquisador, Theodor Bischoff, observaram uma característica que reforçava a ideia de que esses animais eram anfíbios: a presença de pulmões! Mas não pense que a polêmica terminou por aí…
Pouco tempo depois, enquanto estudava uma espécie de piramboia descoberta na África, o naturalista inglês Richard Owen concluiu que, apesar de possuírem pulmões, esses animais são peixes, sim senhor. A partir daí, pesquisadores de várias partes da Europa se dividiram: uns batiam o pé afirmando que as piramboias são anfíbios, enquanto outros insistiam serem peixes.
Com o passar dos anos e após a publicação da Teoria da Evolução em 1859, o enigma da piramboia foi sendo solucionado. Hoje sabemos, graças a muitos estudos de anatomia das espécies viventes e fósseis e também pelo DNA, a verdadeira identidade deste intrigante animal: um peixe que, na linha evolutiva, é parente próximo dos ancestrais dos primeiros anfíbios, que viveram milhões de anos atrás.