Em 1758, o pesquisador sueco Carl von Linné – o “pai” da nomenclatura científica de plantas e animais – recebeu em seu gabinete de trabalho um réptil originário da América do Sul, com corpo alongado e sem pernas, coberto com centenas de anéis formados por pequenas escamas quadradas, e com uma estranha cauda curta e grossa, que mais parecia uma segunda cabeça. Era uma espécie nova, ainda desconhecida dos demais pesquisadores, e ele resolveu batizá-la de Amphisbaena alba.
Nas lendas antigas, amphisbaena (que, em grego, significa “caminhar para os dois lados”) era uma serpente com duas cabeças, uma em cada ponta do corpo, que podia andar tanto para frente quanto para trás. O nome específico alba (“branca”, em latim) se referia à cor dos dois exemplares que Linné usou para descrever a espécie – os quais, na verdade, devem ter ficado esbranquiçados após serem guardados em álcool ou outro líquido conservador, já que, em vida, esse animal tem tons de amarelo e bege.
Alguns anos depois, em 1791, os cientistas britânicos George Shaw e Frederick Polydore Nodder batizaram uma nova espécie como Amphisbaena rosea, devido à sua cor… rosada! Em 1822, foi a vez de o naturalista alemão Johann Wolf descrever o que ele julgava ser outra espécie – por causa do formato de sua cauda, o animal ganhou o nome de Amphisbaena pachyura (“cauda grossa”, em grego). Três anos mais tarde, o também alemão Maximilian Alexander Philipp, príncipe de Wied-Neuwied, deu o nome de Amphisbaena flavescens (“de cor amarelada”, em latim) a um exemplar que ele tinha capturado no sul da Bahia.
Sessenta anos se passaram e, em 1885, o americano Edward Drinker Cope descreveu Amphisbaena beniensis, espécie batizada em referência ao rio Beni, na Bolívia.
Naquele mesmo ano, o belga George Albert Boulenger, renomado especialista do Museu Britânico, chegou à conclusão de que os exemplares de Amphisbaena alba, Amphisbaena rosea, Amphisbaena pachyura e Amphisbaena flavescens pertenciam todos a uma mesma espécie. Esse resultado foi confirmado pelo pesquisador alemão Carl Gans em 1962 – aliás, ele também disse que Amphisbaena beniensis não era uma espécie diferente.
Portanto, se todos esses nomes científicos se referem a uma só espécie, e não a cinco espécies diferentes como se pensava , isso quer dizer que eles são… sinônimos! Mas por qual nome a espécie deve então ser chamada? A solução é simples: pelo nome mais antigo. Neste caso, Amphisbaena alba, que foi criado em 1758. Este nome passa também a ser conhecido como “sinônimo sênior”, enquanto os outros quatro são “sinônimos juniores”, e não devem mais ser usados para se referir a essa espécie.
O caso da Amphisbaena alba não é raridade. Muitas espécies batizadas nos séculos passados têm histórias parecidas – e igualmente confusas. Por isso, os sinônimos são muito importantes para os nomes científicos dos seres vivos!
Henrique Caldeira Costa,
Departamento de Zoologia
Universidade Federal de Juiz de Fora
Sou biólogo e muito curioso. Desde criança tenho interesse em pesquisar os seres vivos, especialmente o mundo animal. Vamos fazer descobertas incríveis aqui!