Imperador cientista

O Japão não é só um país que fica longe, muito longe do Brasil. Há muitas curiosidades escondidas no seu território, um conjunto de ilhas no oceano Pacífico. Lá não há um presidente, mas um imperador, título que é passado de pai para filho. No passado, o imperador era quem realmente mandava no país, mas hoje em dia ele exerce um papel simbólico. Quem governa mesmo é o primeiro-ministro, escolhido pelo parlamento, cujos representantes são eleitos pela população.

O Imperador do Japão, Akihito (à esquerda) e seu pai, o Imperador Hirohito, que também foi um cientista (à direita, ao lado de Akihito ainda jovem). (fotos: Wikipedia e Free World Magazine [reproduzido por Sustainable Living Institute])

O Imperador do Japão, Akihito (à esquerda) e seu pai, o Imperador Hirohito, que também foi um cientista (à direita, ao lado de Akihito ainda jovem). (fotos: Wikipedia e Free World Magazine [reproduzido por Sustainable Living Institute])

O atual Imperador do Japão é Akihito. Nascido em 1933, ele subiu ao trono japonês em 1989 após a morte de seu pai, o Imperador Hirohito. Um detalhe muito interessante da vida de Akihito é que ele é um especialista em peixes da família Gobiidae, tendo escrito cerca de 40 trabalhos científicos sobre suas características e evolução, além de ter descoberto algumas espécies. Os peixes Gobiidae são assim chamados por causa do gênero Gobius, descrito em 1758 e cujo nome que vem do grego kobius, um tipo de peixe pequeno.

Ao longo de sua carreira de pesquisador, iniciada quando ainda era Príncipe do Japão, Akihito contou principalmente com a colaboração de Katsusuke Meguro, um funcionário da casa real japonesa. Juntos, os dois descreveram em 1975 a espécie Pandaka trimaculata, uma das menores espécies de peixes do mundo, com pouco mais de 1 centímetro de comprimento, encontrada no Japão e Filipinas. Pandaka significa “anão”, em algumas línguas das Filipinas, e trimaculata vem do latim “com três manchas”, em referência às manchas que os exemplares da espécie possuem no ventre.

Ainda em 1975, Akihito e Meguro descreveram a espécie Glossogobius aureus, “dourado”, em latim. No ano seguinte, publicaram a descoberta de Glossogobius sparsipapillus, “papilas esparsas”, em latim, nome que faz referência a pequeninos órgãos sensoriais parecidos com pontinhos, localizados na cabeça dos peixes dessa espécie, e que auxiliam na percepção de movimentos e vibrações na água. O nome Glossogobius é uma mistura de glosso (“língua”, em grego) e Gobius, gênero que dá nome à família Gobiidae, porque os Glossogobius possuem uma língua com características que os diferenciam dos Gobius.

Glossogobius aureus (A), Glossogobius sparsipapillus (B), e Cristatogobius rubripectoralis (C), espécies descobertas pelo Imperador Akihito. (fotos: Dinh D. Tran, FiMSEA [A e B], Rick Winterbottom, http://fishesofaustralia.net.au [C] e Wikipedia [D])

(i)Glossogobius aureus(/i) (A), (i)Glossogobius sparsipapillus(/i) (B), e (i)Cristatogobius rubripectoralis(/i) (C), espécies descobertas pelo Imperador Akihito. (fotos: Dinh D. Tran, FiMSEA [A e B], Rick Winterbottom, http://fishesofaustralia.net.au [C] e Wikipedia [D])

Na maioria das vezes, Akihito gosta de dar às espécies que descobre um nome derivado do latim, relacionado à cor dos animais em vida. É o caso de Cristatogobius aurimaculatus (“manchado de dourado”), Cristatogobius rubripectoralis (“peitoral vermelho”), Astrabe flavimaculata (“manchado de amarelo”), Astrabe fasciata (“com faixas”) e Myersina nigrivirgata (“varinha negra”, por causa de uma faixa negra lateral).

As espécies Astrabe flavimaculata (topo) e Myersina nigrivirgata (inferior), também foram descobertas pelo Imperador Akihito do Japão. (fotos: Okamoto Sunachi / Laboratory of Marine Biology, Kochi University; Andrey Ryanskiy / CC BY-NC 3.0)

As espécies (i)Astrabe flavimaculata(/i) (topo) e (i)Myersina nigrivirgata(/i) (inferior), também foram descobertas pelo Imperador Akihito, do Japão. (fotos: Okamoto Sunachi / Laboratory of Marine Biology, Kochi University; Andrey Ryanskiy / CC BY-NC 3.0)

Os nomes dos gêneros, Cristatogobius, Astrabe e Myersina não foram criados pelo Imperador, mas merecem uma explicação: Cristatogobius quer dizer “Gobius com crista” em latim, por causa de uma pequena crista atrás da cabeça. Astrabe significa “sela” em grego, porque suas espécies possuem faixas coloridas que lembraram a sela de um cavalo. Por fim, Myersina é uma homenagem a Geroge Myers, um ictiólogo – especialista em peixes – norte-americano, que viveu entre 1905 e 1985.

As pesquisas do Imperador Akihito são reconhecidas mundo afora por outros cientistas. Tanto é que algumas espécies e até um gênero de peixe ganharam seu nome como forma de homenagem.

O gênero de peixes Akihito recebeu esse nome em homenagem ao imperador do Japão. As duas espécies acima, A. vanuatu (topo) e A. futuna (inferior), ganharam o nome das ilhas de Vanuatu e Futuna, no oceano Pacífico, onde são encontradas. (fotos: E. Vigneux e P. Keith, Cybium)

O gênero de peixes (i)Akihito(/i) recebeu esse nome em homenagem ao imperador do Japão. As duas espécies acima, (i)A. vanuatu(/i) (topo) e (i)A. futuna(/i) (inferior), ganharam o nome das ilhas de Vanuatu e Futuna, no oceano Pacífico, onde são encontradas. (fotos: E. Vigneux e P. Keith, Cybium)

Indo além, Akihito ganhou no Reino Unido em 1998 a Medalha Rei Charles II, oferecida a governantes que contribuem para o avanço da ciência em benefício da sociedade.

O Japão real a serviço da ciência!