Ciência com samba no pé

No dia 24 de abril de 1924, nasceu, na cidade de São Paulo, o pequeno Paulo Emílio, primeiro filho de Carlos Alberto Vanzolini e sua esposa, Dona Finoca. Naquela época, ninguém sabia que o menino se tornaria um grande cientista e sambista brasileiro. Com vocês, Paulo Vanzolini!

Paulo Vanzolini foi professor da Universidade de São Paulo e, por 32 anos, dirigiu o Museu de Zoologia da instituição, um dos maiores e mais importantes da América do Sul (Foto cedida por Paulo E. Vanzolini à revista (i)Ciência Hoje(/i))

Paulo Vanzolini foi professor da Universidade de São Paulo e, por 32 anos, dirigiu o Museu de Zoologia da instituição, um dos maiores e mais importantes da América do Sul (Foto cedida por Paulo E. Vanzolini à revista (i)Ciência Hoje(/i))

Quando pequeno, Paulo não gostava muito da escola. Para que fosse bem nas provas, seu pai chegou a lhe prometer uma bicicleta. O menino, então com 10 anos, tratou de estudar, ganhou o presente e ia pedalando toda semana até o Instituto Butantan, perto de casa, para ver as serpentes. Assim surgiu sua paixão pelos répteis.

Alguns anos depois, o jovem cursou faculdade em São Paulo e foi aos Estados Unidos se especializar no estudo dos répteis. Quando retornou, explorou muitas regiões do Brasil e descobriu dezenas de novas espécies, principalmente de lagartos e anfisbenas – popularmente chamadas de “cobras-de-duas-cabeças”.

Paulo – ou Vanzo, como os amigos o chamavam – era respeitado por muitos colegas e alunos, que batizaram espécies animais em sua homenagem. Um exemplo é Vanzosaura rubricauda, cujo nome quer dizer “lagarto do Vanzo de cauda vermelha”, em uma mistura de grego e latim. Há também os exuberantes anfíbios da espécie Ranitomeya vanzolinii (Ranitomeya é uma mistura de ranita – “pequena rã”, em espanhol – com o nome de um criador de anfíbios, W. A. Tomey).

Os lagartinhos da espécie (i)Vanzosaura rubricauda(/i) podem ser encontrados em áreas abertas do Cerrado e da Caatinga. Já as rãs (i)Ranitomeya vanzolinii(/i) vivem nas florestas do oeste da Amazônia (Fotos: Renato Gaiga e Paulo R. Melo Sampaio)

Os lagartinhos da espécie (i)Vanzosaura rubricauda(/i) podem ser encontrados em áreas abertas do Cerrado e da Caatinga, enquanto as rãs (i)Ranitomeya vanzolinii(/i) vivem nas florestas do oeste da Amazônia (Fotos: Renato Gaiga e Paulo R. Melo Sampaio)

Já as lagartixas Gymnodactylus vanzolinii não são tão coloridas, mas são raras – vivem somente na Serra de Sincorá, na Bahia. Gymnodactylus, em grego, quer dizer “dedos nus”, e se refere aos seus dedos finos, que, ao contrário de outras lagartixas, não possuem estruturas especiais para escalar.

Em 2005, Vanzo ganhou homenagem em um peixe: Leporinus vanzoi – nome um tanto curioso, já que Leporinus quer dizer “de lebre” em latim. O motivo está em sua boca e dentes, que lembram vagamente os de uma lebre ou coelho. Paulo também teve seu nome registrado em uma espécie de micos, Saimiri vanzolinii – de origem indígena, Saimiri é como os nativos amazônicos chamavam alguns tipos de macaquinhos.

As lagartixas (i)Gymnodactylus vanzolinii(/i) vivem sobre as rochas de uma serra baiana, enquanto os micos (i)Saimiri vanzolinii(/i) só podem ser vistos na Reserva de Mamirauá, no Amazonas. Os peixes da espécie (i)Leporinus vanzoi(/i) são encontrados no rio Tapajós, no Pará (Fotos: Felipe Leite, Cláuio Timm / CC BY-SA 2.0 e Projeto SACI / MZUSP / Fernando M. Ferreira)

As lagartixas (i)Gymnodactylus vanzolinii(/i) vivem sobre as rochas de uma serra baiana, enquanto os micos (i)Saimiri vanzolinii(/i) só podem ser vistos na Reserva de Mamirauá, no Amazonas. Os peixes da espécie (i)Leporinus vanzoi(/i) são encontrados no rio Tapajós, no Pará (Fotos: Felipe Leite, Cláuio Timm / CC BY-SA 2.0 e Projeto SACI / MZUSP / Fernando M. Ferreira)

Paulo Vanzolini foi ainda homenageado com outras espécies de lagartos e sapos, uma serpente, uma aranha, um gongolô, uma mosca e até um piolho de pássaros. Agora, se eu tiver que escolher minha favorita, não tenho nem dúvida: o grilo Vanzoliniella sambophila.

Em latim, ella é um diminutivo, então podemos traduzir o nome do gênero como “Vanzolinizinho”. Já sambophila quer dizer “amante do samba”, em uma mistura de português com grego para homenagear o lado sambista de Vanzo – que compôs “Ronda” e “Volta por cima”, entre outras músicas famosas – e o cri-cri dos machos da espécie, que fazem verdadeiras serenatas para as fêmeas.

Paulo Vanzolini faleceu no dia 28 de abril, aos 89 anos – mas, como você viu, tem muitos motivos para ser lembrado!