Andarilhos de veludo

Você já parou para observar o chão de uma floresta? Em meio a folhas e troncos em decomposição, podemos encontrar uma grande diversidade em miniatura: cogumelos, pequenas plantas, besouros, formigas, aranhas, lacraias, lagartixas, e, com sorte, até onicóforos. Aliás, você sabe o que é um onicóforo?

Os onicóforos são pequenos invertebrados de corpo mole, alongado, com 13 a 43 pares de pernas. Eles vivem embaixo de troncos e rochas no interior de florestas e são conhecidos como velvet worms (expressão em inglês para “vermes de veludo”), por causa da textura aveludada do seu corpo, coberto por milhares de microescamas. Na cabeça, possuem uma pequena boca circular, duas antenas, um par de olhos e um par de pernas modificadas capazes de esguichar uma substância adesiva que imobiliza suas presas imediatamente.

O <i>Epiperipatus acacioi</i> vive em fendas no solo na Estação Ecológica do Tripuí, em Ouro Preto, Minas Gerais. Pode atingir cerca de seis centímetros de comprimento e se alimenta de outros animais menores. Esta e muitas outras espécies de onicóforos não botam ovos, mas parem filhotes já completamente formados (Foto: Ivo de Sena Oliveira)

O Epiperipatus acacioi vive em fendas no solo na Estação Ecológica do Tripuí, em Ouro Preto, Minas Gerais. Pode atingir cerca de seis centímetros de comprimento e se alimenta de outros animais menores. Esta e muitas outras espécies de onicóforos não botam ovos, mas parem filhotes já completamente formados (Foto: Ivo de Sena Oliveira)

A primeira espécie de onicóforo foi nomeada em 1826, por Lansdown Guilding. Ele apresentou à comunidade científica uma estranha criatura que encontrara na ilha de São Vicente, no Caribe. O cientista acreditava que o curioso animal era um molusco terrestre – como lesmas e caracóis –, por isso deu-lhe o nome de Peripatus juliformis.

Peripatus tem origem em uma palavra grega e pode ser traduzido como “andarilho” ou “rodeado por pernas”, devido a uma característica marcante desses animais, que os fazem lembrar lesmas repletas de perninhas. Já o nome juliformis significa “com forma de amento”, em latim – amento é um tipo de inflorescência de algumas plantas, onde muitas flores pequenas são formadas em uma estrutura comprida.

Nesta imagem de microscópio eletrônico, podemos observar as pequenas garras presentes nos membros locomotores dos onicóforos – característica que deu nome ao grupo (Foto: Ivo de Sena Oliveira)

Nesta imagem de microscópio eletrônico, podemos observar as pequenas garras presentes nos membros locomotores dos onicóforos – característica que deu nome ao grupo (Foto: Ivo de Sena Oliveira)

Com o passar do tempo e a descoberta de novas espécies de onicóforos, os cientistas perceberam que esses animais não são moluscos, e sim integrantes de um grupo bastante diferente, e até então desconhecido, que foi chamado de Onychophora (“portador de garras”, em grego). Esse nome se deve ao fato de cada perninha de um onicóforo possuir pequenas garras.

Desde 1826 até hoje, cerca de 200 espécies de onicóforos foram descobertas na América Central, América do Sul, África, Ásia e Oceania. No Brasil, apenas 15 espécies foram encontradas, mas os especialistas afirmam que há muitas mais para descobrir.

O onicóforo brasileiro com a história mais interessante talvez seja Epiperipatus acacioi, descrito em 1955 pelo casal de pesquisadores Eveline e Ernesto Marcus. O nome do gênero pode ser traduzido como “comparado a Peripatus”, enquanto acacioi é uma homenagem ao Dr. Acacio Costa Júnior, entomólogo que encontrou os primeiros exemplares na Estação Experimental do Tripuí, em Ouro Preto, Minas Gerais.

Esta espécie jamais foi encontrada em outro lugar e a preocupação com sua preservação motivou a criação da Estação Ecológica do Tripuí, uma das únicas áreas de conservação no mundo criadas para proteger um invertebrado. Uma honra para os andarilhos de veludo, não acha?

Matéria publicada em 04.10.2013

COMENTÁRIOS

  • Anna Elise

    É mesmo!Eles devem se sentir como se estivesse em um palácio!

    Publicado em 11 de maio de 2019 Responder

    • Anna Elise

      *estivessem

      Publicado em 11 de maio de 2019 Responder

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Henrique Caldeira Costa

Curioso desde criança, Henrique tem um interesse especial em pesquisar a história por trás dos nomes científicos dos animais, que partilha com a gente na coluna O nome dos bichos

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