O Pão de Açúcar de Marte

Era mais um dia de trabalho para o robô Spirit em Marte. Enviado ao planeta vermelho para explorar a superfície marciana e coletar material para estudo, ele estava a caminho da cadeia de montanhas conhecida como Columbia Hills quando, com sua câmara frontal, captou a imagem de uma rocha. Feita de basalto, medindo cerca de 30 centímetros, coberta por uma camada espessa de poeira, ela lembrava, de certa forma, um cartão-postal: o Pão de Açúcar, do Rio de Janeiro. O que não passou despercebido por um cientista, que propôs chamar a rocha assim, fazendo Marte ganhar o seu Pão de Açúcar!

Claro que o cientista em questão era brasileiro. Seu nome? Paulo Antônio de Souza Júnior. Nascido no Mato Grosso do Sul, mas vivendo hoje no Espírito Santo, ele é o único pesquisador do Brasil a fazer parte da missão da Nasa, a agência espacial americana, que levou os robôs Spirit (Espírito) e Opportunity (Oportunidade) ao planeta vermelho. No início de 2004, Paulo já havia transportado um pouco do nosso país até Marte, ao propor que uma música brasileira fosse usada para “acordar” o Spirit : ou seja, indicar a ele o início de um novo dia de atividade. Agora, repetiu a dose, chamando a rocha de Pão de Açúcar.

O Pão de Açúcar de Marte, destacado no círculo amarelo, é composto por basalto. Essa rocha é formada a partir da atividade vulcânica: quando a lava endurece, dá origem a ela. O basalto existe em Marte porque esse planeta tem grandes vulcões (o maior deles tem 25 mil metros de altura, três vezes mais que a montanha mais alta da Terra!). Outro detalhe sobre o basalto é que ele, assim como um sal-de-fruta, se degrada rapidamente na presença de água, formando os minerais que dão origem ao solo avermelhado de Marte. Ao contrário do Pão de Açúcar carioca, o marciano nunca viu água desde que se formou!

No entanto, se a idéia com a canção era fazer o robô “acordar bem disposto”, como brinca Paulo, a finalidade de dar nomes às rochas é outra. “Batizamos as rochas porque isso nos ajuda a identificá-las durante o trabalho”, explica o cientista. “Quando alguém fala em Pão de Açúcar, por exemplo, eu já sei de qual rocha se trata.”

Em geral, as rochas são batizadas a partir da semelhança que têm com algo da Terra. Por exemplo: duas rochas marcianas foram chamadas de sushi e sashimi porque lembravam muito essas delícias da cozinha japonesa. Mas nomes também podem ser dados como forma de prestar uma homenagem, como ocorreu com a cadeia de montanha Columbia Hills, que citamos no início do texto. Ela foi chamada assim em memória da tripulação do ônibus espacial Columbia, que explodiu em fevereiro de 2003.

Acima, a cadeia de montanhas marciana conhecida como Columbia Hills (foto: Mars Exploration Rover Mission, JPL, Nasa)

O estudo das rochas de Marte, como o Pão de Açúcar e tantas outras, é muito importante. “As rochas são como um livro que conta a evolução de qualquer planeta”, explica Paulo. A partir das análises feitas pelo Spirit e pelo Opportunity , por exemplo, os cientistas chegaram à conclusão de que existiu água em Marte no passado. Assim, crescem as chances de ter havido vida no planeta vermelho tempos atrás, o que leva a Nasa a planejar uma nova missão com robôs para buscar indícios disso na superfície marciana. Dependendo das informações que eles enviem, quem sabe a gente não descobre que Marte teve água e vida no passado, assim como possui um Pão de Açúcar no presente?

Você sabia…
… que, em Marte, há uma cratera chamada Campos e outra Lins? Elas foram batizadas assim em homenagem a duas cidades brasileiras: Campos, no estado do Rio de Janeiro, e Lins, no Estado de São Paulo.
… que existe, na Lua, uma cratera com o nome de Santos Dumont?
… que há um asteróide chamado Mourão, uma homenagem ao astrônomo brasileiro Ronaldo Rogério de Freitas Mourão? E outro com o nome do astronauta brasileiro Marcos César Pontes?
(informações gentilmente cedidas pelo físico Marcelo de Oliveira Souza, da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro)