Joia do Araripe

A delicada ave fóssil recém-descoberta no Ceará não se parece nem um pouco com aquilo que vem à nossa cabeça quando pensamos em pré-história: não se trata de um bicho enorme, nem assustador. Ao contrário, o animal, de 115 milhões de anos, tinha o tamanho aproximado de um beija-flor, cauda comprida e muitas penas pelo corpo. Ainda sem nome científico, a espécie foi identificada apenas como pertencente aos Euenantiornithes, grupo de aves extinto e que não deixou descendentes.

A ave considerada a mais antiga do Brasil media 14 centímetros da ponta do bico à ponta da cauda. Tinha olhos bem grandes e dentes no bico, e alimentava-se provavelmente de insetos que viviam em sua região. (ilustração: Deverson Pepi)

A ave considerada a mais antiga do Brasil media 14 centímetros da ponta do bico à ponta da cauda. Tinha olhos bem grandes e dentes no bico, e alimentava-se provavelmente de insetos que viviam em sua região. (ilustração: Deverson Pepi)

O fóssil foi encontrado na Bacia do Araripe, em uma área de pedreiras de onde se extraem rochas para a construção civil. Seu estado de conservação é impressionante: a maior parte de suas penas originais está preservada, o que não é muito comum em materiais tão antigos.

O geólogo Ismar Carvalho, pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro e colunista da CHC, liderou a descoberta e nos contou que o corpo da ave foi preservado graças à composição química das rochas calcárias onde foi achado. O mesmo aconteceu com muitos outros fósseis já encontrados na região – por isso a Bacia do Araripe é tão importante para a paleontologia brasileira!

A análise dos ossos do fóssil mostrou que se tratava de um filhote. O material, excepcionalmente bem preservado, vai permitir encontrar novas pistas sobre o passado das aves no planeta. (foto: Ismar Carvalho)

A análise dos ossos do fóssil mostrou que se tratava de um filhote. O material, excepcionalmente bem preservado, vai permitir encontrar novas pistas sobre o passado das aves no planeta. (foto: Ismar Carvalho)

Outra característica especial do fóssil recém-descoberto é que ele deixou sua impressão em um formato em três dimensões. “Algo raro nos fósseis encontrados até hoje!”, celebra Ismar. “Isso se deve a diversos fatores, como a baixa quantidade de oxigênio nas águas cristalinas da bacia na época”. Há milhões de anos, o Araripe era um lago com águas alcalinas e muito calmas, servindo de lar para uma enorme diversidade de organismos, entre plantas e animais vertebrados e invertebrados.

A descoberta de Ismar e sua equipe aumenta a área do planeta que sabemos ter sido ocupada por aves durante a era Mesozoica (entre 251 e 65,5 milhões de anos atrás), mais especificamente no período Cretáceo, há 115 milhões de anos. Até agora, fósseis do grupo dos Euenantiornithes só haviam sido encontrados na China.

Segundo Ismar, o fóssil brasileiro está mais preservado que seus pares chineses e, por isso, pode dar ainda mais informações sobre a evolução das aves no planeta. “As aves que encontramos anteriormente estavam mal preservadas e não permitiam um estudo mais detalhado”, diz o pesquisador. “Além disso, não se conhece ave mais antiga do que essa no Brasil: isso significa que ela é uma joia da ciência!”