Cara de um, focinho do outro

No alto, Snuppy posa ao lado do cachorro a partir do qual foi clonado. Embaixo, ele aparece ao lado da cadela da raça labrador que "emprestou" seu útero para a gestação do clone. (fotos: Universidade Nacional de Seul)

Snoopy, você conhece: é o cachorro do Charlie Brown, um beagle que tem como melhor amigo um pássaro chamado Woodstock. Mas será que já ouviu falar no Snuppy (repare na grafia diferente do nome)? É provável. Esse simpático filhote da raça afghan hound virou notícia. Adivinhe por quê!

Snuppy é um clone. Isto é, uma cópia fiel de um outro cachorro da raça afghan hound. Cópia? Sim, podemos dizer isso porque Snuppy tem o DNA igual ao desse outro cão. O DNA é uma seqüência de códigos que define as características físicas de cada ser vivo – e tanto Snuppy quanto o outro cachorro têm o DNA idêntico.

Esse filhote de afghan hound é o primeiro clone de cachorro do mundo. Ele nasceu graças ao trabalho de uma equipe formada por um pesquisador dos Estados Unidos e por cientistas da Coréia do Sul – tanto é que seu nome é uma abreviação da frase “filhote da Universidade Nacional de Seul”, quando escrita em inglês (Seul é a capital da Coréia do Sul). “Nós quisemos dar ao cachorro um nome que representasse algo”, contou à Ciência Hoje das Crianças Woo-Suk Hwang, que liderou o grupo de cientistas.

Sabe o que ele e seus companheiros fizeram? Não, não colocaram um afghan hound macho junto com uma fêmea da mesma raça para que eles cruzassem e assim nascesse o filhote. Se tivessem feito isso, qual seria a novidade? Nenhuma. Uma célula do cachorro – o espermatozóide – iria encontrar uma outra célula da cadela – a célula-ovo. Desse encontro, seria formada uma nova célula, que se dividiria em duas, em quatro, em oito e assim por diante, formando um embrião – no caso, um filhote de cachorro nos primeiros estágios do seu desenvolvimento. E ele teria um DNA próprio, diferente do pai e da mãe.

Você se lembra da Dolly?
Foi com Dolly que os cientistas mostraram pela primeira vez que uma célula qualquer de um animal pode gerar um novo indivíduo e não só a união do espermatozóide com a célula-ovo.
Para que Dolly nascesse em 1996, cientistas usaram uma técnica totalmente nova para a época e três ovelhas. Primeiro, pegaram uma célula-ovo da ovelha 1 e retiraram o seu núcleo, onde está o DNA. Depois, conseguiram uma célula da mama da ovelha 2. Tiraram o seu núcleo e inseriram dentro da célula-ovo da ovelha 1. Essa célula-ovo da ovelha 1 com o núcleo da célula de mama da ovelha 2 foi posto no útero da ovelha 3, desenvolveu-se e gerou uma ovelha com DNA igual ao da ovelha 2: Dolly, o clone.
Em 2001, descobriu-se que Dolly tinha artrite – uma inflamação – no quadril e no joelho esquerdos. Em 2003, a ovelha apresentou uma doença no pulmão e, por isso, foi sacrificada. Como morreu jovem, com seis anos de idade, surgiu a dúvida: será que ela não havia apresentado esses problemas de saúde por ser um clone? Os cientistas que a criaram, no entanto, garantem que não há razão para acreditar que Dolly estava mais vulnerável a doenças por ser um animal clonado.

Para que um cachorro com as características de Snuppy nascesse, era preciso fazer algo diferente. A equipe do cientista Woo-Suk Hwang usou, então, a técnica que deu origem ao primeiro clone do mundo: a ovelha Dolly (leia o quadro Você se lembra da Dolly? ).

Os pesquisadores coletaram células-ovo de várias cadelas. A seguir, removeram o núcleo de cada uma e o substituíram pelo núcleo retirado de células da pele de um afghan hound adulto. Em nenhum momento colocaram as células-ovo em contato com espermatozóides, mas mesmo assim conseguiram formar mais de mil embriões.

Todos eles foram transferidos para 123 cadelas. Somente três delas, no entanto, ficaram prenhas, de fato. E apenas duas conseguiram levar a gestação até o fim. Snuppy nasceu de uma cadela da raça labrador. Um outro filhote – chamado NT-2 – nasceu de uma cachorra vira-lata, mas morreu, com 22 dias de vida, de pneumonia.

Antes de Snuppy, diversos animais já haviam sido clonados pelos cientistas: ovelhas, ratos, vacas, porcos, coelhos, gatos… Demorou para que os cachorro entrassem nessa lista porque as células-ovo desses animais são lançadas do ovário – o local onde ficam guardadas – mais cedo do que em outros mamíferos e quando ainda não estão completamente maduras. Os pesquisadores liderados por Woo-Suk Hwang mostraram que a clonagem desses bichos é possível, mas pouco eficiente. Afinal, todo o trabalho resultou em um único clone sadio: Snuppy. E sabe quem está cuidando desse filhote? Os próprios cientistas, contou Woo-Suk Hwang à CHC.

Se, depois de ouvir essa história, você ficou interessado em procurar esse pesquisador para clonar o seu cachorro… Esqueça! “Clonar animais de estimação não é o nosso principal interesse”, explica ele. Na verdade, a idéia seria ter diversos animais idênticos para estudar a origem, o desenvolvimento e o tratamento de doenças.