Anfíbio com pinta de jacaré

Dê uma conferida na foto abaixo. Não sei para você, mas, para mim, o bicho tem cara de jacaré. Para minha surpresa, ao pesquisar mais sobre ele, descobri que não se trata de um réptil, e sim de um anfíbio pré-histórico chamado Australerpeton cosgriffi. Essa espécie curiosa foi descoberta em 1974, mas apenas recentemente fósseis encontrados na Serra do Cadeado, no Paraná, permitiram aos pesquisadores desvendar com mais detalhes as suas características.

Reconstrução do (i)Australerpeton cosgriffi(/i) no ambiente onde viveu no passado. (ilustração: Rodolfo Nogueira)

Reconstrução do (i)Australerpeton cosgriffi(/i) no ambiente onde viveu no passado. (ilustração: Rodolfo Nogueira)

O animal, um parente dos sapos e salamandras que conhecemos hoje, chegava a dois metros de comprimento e alimentava-se de peixes. Seu hábitat natural eram lagoas e rios, e uma característica marcante de sua aparência era o focinho comprido, parecido com o de um jacaré – uma adaptação ao ambiente em que vivia, pois lhe ajudava a pescar. Apesar da semelhança física com os répteis, Australerpeton cosgriffi é classificado como anfíbio por causa das características do seu crânio, como a presença de grandes aberturas no palato, ou seja, grandes buracos no céu da boca do animal.

Diferentes fósseis do (i)Australerpeton cosgriffi(/i) encontrados no sítio geológico Serra do Cadeado. (imagens: Estevan Eltink)

Diferentes fósseis do (i)Australerpeton cosgriffi(/i) encontrados no sítio geológico Serra do Cadeado. (imagens: Estevan Eltink)

A espécie viveu num período conhecido como Permiano, cerca de 260 milhões de anos atrás. Naquela época, os continentes eram unidos em uma grande massa de terra chamada Pangeia. Parece difícil de visualizar, mas a América do Sul e a África eram vizinhos próximos! Por isso, acredita-se que o Australerpeton cosgriffi tenha forte parentesco com espécies pré-históricas africanas.

Mas descobrir a árvore genealógica do Australerpeton cosgriffi não foi tarefa das mais fáceis. O bicho pregou uma peça nos pesquisadores! O paleontólogo Estevan Eltink, da Universidade de São Paulo, contou à CHC que sua aparência externa guardava semelhanças com fósseis descobertos na Europa. O que permitiu ligar Australerpeton cosgriffi aos seus parentes africanos foi um detalhe pequeníssimo: o aparelho auditivo do animal, característico da família a que pertence. “Por mais que se pareça muito com os anfíbios focinhudos do leste europeu, ele tem um parentesco mais próximo com anfíbios do sul da África”, concluiu o especialista.

Quebra-cabeças

A história do Australerpeton cosgriffi é um bom exemplo de como pode ser desafiador estudar organismos do passado. Os primeiros fósseis dessa espécie eram muito fragmentados e não permitiam aos pesquisadores descrever o animal como um todo. Foi preciso continuar procurando fósseis e, ao encontrá-los, juntá-los aos já descobertos, a fim de montar um grande quebra-cabeças.

Neste caso, como em muitos outros, os fósseis usados pelos paleontólogos para descrever a espécie foram descobertos em locais diferentes, o que tornou o trabalho mais complexo. Mas quem não gosta de um bom desafio, não é mesmo?