Um pequeno réptil em um mundo de gigantes

Assim devia ser a tartaruga Cambaremys langertoni, que viveu há 70 milhões de anos. A réplica foi construída a partir dos fósseis encontrados pelos cientistas.

Como seria viver na Terra há cerca de 70 milhões de anos, rodeado por gigantescos dinossauros herbívoros e ameaçado por muitas outras espécies carnívoras? Difícil? Fantástico? Encantador? E se você fosse apenas uma tartaruga de 25 centímetros de comprimento? Pois essa era nesse ambiente que vivia a Cambaremys langertoni , uma espécie que paleontólogos do campus de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo, acabam de apresentar.

A tartaruga habitava o local onde hoje fica a região de Peirópolis, próxima da cidade de Uberaba, em Minas Gerais. Se você gosta de quebra-cabeças e já pensou em ser paleontólogo, iria adorar Peirópolis. No período conhecido como Cretáceo, há cerca de 70 milhões de anos, o lugar em que hoje está o estado de Minas era muito quente e, de vez em quando, fortes chuvas que varriam seus solos. Quando essas chuvas caíam, arrastavam os restos dos animais mortos ali. Resultado: misturava tudo.

Por conta disso, hoje é difícil identificar as ossadas encontradas em Peirópolis. No caso da Cambaremys langertoni, porém, a sorte esteve do lado dos cientistas: parece que, logo após sua morte, a tartaruguinha foi soterrada pela lama e a sua carapaça, virada de cabeça para baixo, permitiu que quase 90% de todo o seu esqueleto fosse preservado. Trata-se do fóssil de tartaruga mais completo já encontrado na região. Boa notícia para nós que, com o seu estudo, podemos conhecer melhor como era a vida no fim do Cretáceo.

Por exemplo, você saberia dizer se outras ossadas de tartarugas já descobertas em Peirópolis são de animais terrestres ou aquáticos? Para responder, precisamos analisar as patas dos bichos, mas esta foi a primeira vez que se achou um fóssil de tartaruga com patas na região. O animal recém-descrito não era exclusivamente aquático ou terrestre, mas, como fazem algumas espécies amazônicas atuais, caminhava no fundo dos rios em busca de alimentos. A Cambaremys langertoni era uma espécie que se alimentava tanto de plantas aquáticas e frutas quanto de animais (larvas, insetos e pequenos peixes).

Note como são pequenos os ossos da tartaruga Cambaremys langertoni encontrados em Minas Gerais: ela tinha apenas 25 cm de comprimento!

A carapaça com placas pouco unidas, para permitir o crescimento do corpo do animal, mostra que a tartaruga morreu ainda jovem. “Comparando com as que existem hoje, estimamos que essas tartarugas poderiam alcançar cerca de um metro de comprimento, na idade adulta”, afirma o paleontólogo Luiz Carlos Borges Ribeiro, diretor do Centro de Pesquisas Paleontolgicas Llewellyn Ivor Price e do Museu dos Dinossauros de Peirópolis.

Mas se você pensa que essa tartaruga é, de certa forma, parente da que você tem aí no quintal da sua casa… Saiba que, na verdade, o fóssil descrito pertence à família Podocnemidae, a mesma da tartaruga da Amazônia ( Podocnemis expansa ) e a do tracajá ( Podocnemis unifilis ), encontrados no norte do Brasil. Além da Amazônia, os integrantes dessa família habitam hoje a ilha de Madagascar, na África. “Essas tartarugas eram muito mais comuns no fim do Cretáceo, nas terras que hoje correspondem à Índia, África e América do Sul”, afirma Luiz Carlos. “Esses dados parecem mais uma vez comprovar a teoria de que essas três regiões formavam um único continente no passado.”

Curioso para saber como devia ser essa tartaruga 70 milhões de anos atrás? Pois baseados nos dados obtidos com o estudo desse esqueleto tão completo e bem conservado, os cientistas se preocuparam em criar réplicas tanto do animal quanto da região em que ele vivia. Em grande parte, para despertar o interesse de crianças como você pela paleontologia. Vai dizer que eles não tiveram sucesso?

Matéria publicada em 18.01.2006

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Marcelo-Garcia

Sou um curioso apaixonado por ciência e adoro quadrinhos e ficção científica. Quase virei cientista, mas preferi me dedicar a mostrar pra todo mundo que a ciência está em tudo ao nosso redor!

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