A Vemaguet, as estrelas-do-mar e as areias do tempo

Mal havia clareado e já estávamos a caminho da praia. Era sábado e tudo prometia um dia ensolarado. Morávamos próximo às montanhas, no interior, longe de qualquer praia, mas o prenúncio do calor do verão fazia com que as famílias seguissem em grupos em direção ao mar.

Vemaguet azul

Na nossa velha Vemaguet, cada curva era uma emoção. Ficava sempre a dúvida: conseguiríamos chegar até o nosso destino? (Foto: Wikimedia Commons)

A longa jornada se tornava ainda mais demorada pela curvas da estrada estreita e por nosso carro – a Vemaguet. Seguia roncando pela estrada, numa expectativa geral de que não resistiria à curva seguinte. Íamos com o arroz e o frango preparados na véspera, sanduíches, refrigerantes e pelo menos uma grande boia preta. Primos, tios, avós, irmãos, todos juntos para o que seria mais um passeio inesquecível.

Naquele dia, a praia escolhida foi especial. Após muito viajar, chegamos a um local em que somente as árvores bordejavam uma praia ainda selvagem. O local era de tirar o fôlego, com areias finas, brancas e as águas translúcidas. No primeiro mergulho, a grande surpresa: centenas e centenas de peixes por todos os lados.

Mas o que mais me impressionava era a areia. Os grãos uniformes, finos e brancos como um grande tapete de sal. De onde teriam vindo? E, no meio deles, as estrelas-do-mar, ouriços e conchas carregadas pelas ondas, cujos esqueletos se via por todos os lados.

Desenho de mar do período Paleozoico

Nos mares do passado, a vida também foi bastante abundante. Esta é a reconstituição um mar de 350 milhões de anos que existiu no interior do Brasil, com uma fauna variada de trilobitas, moluscos, crinoides e corais (Ilustração: Ariel Milani Martine)

Os mares sempre foram locais em que a vida existiu de forma abundante e diversificada. Há pelo menos 540 milhões de anos, no tempo conhecido como era Paleozoica, iniciou-se a proliferação de animais, cujos descendentes ainda hoje habitam os oceanos.

Os ouriços, estrelas-do-mar, moluscos, corais, artrópodes, e outros menos comuns, como os braquiópodes e briozoários iniciaram, então, uma longa jornada de diversificação e ocupação dos ambientes marinhos. Ao morrerem, seus esqueletos foram incorporados às areias do fundo dos oceanos e das praias, possibilitando que posteriormente muitos fossem transformados em fósseis, ou simplesmente em mais um pequeno grão de areia.

Os invertebrados que já existiram ao longo do tempo geológico nos oceanos são incontáveis. Por vezes minúsculos, só possíveis de serem observados ao microscópio, e, em outros casos, gigantescos. Formas, tamanhos, cores e diversidade só comparáveis aos bilhões e bilhões de grãos de areia de uma longa praia.

No final do dia, mergulho após mergulho, iniciamos nosso longo retorno para casa. A Vemaguet repleta de conchas, estrelas-do-mar, ouriços e, é claro, areia para todos os lados. Esses tesouros se perderam no caminho e ao longo do tempo. Mas, como os fósseis preservados na Terra, permanecem para sempre em nossas memórias daquele dia de verão.

Matéria publicada em 09.12.2011

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Ismar de Souza Carvalho de Souza Carvalho

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